Uma propaganda de 60 segundos da Coca-Cola Company, veiculada em Bangladesh, alimentou críticas à corporação sediada em Atlanta, nos Estados Unidos, por tentar ludibriar o público e se distanciar de Israel no contexto do genocídio em Gaza.
As informações são da rede Al Jazeera.
Desde outubro, dezenas de empresas, incluindo a Coca-Cola, enfrentam um declínio vertiginoso em suas vendas em países de maioria islâmica, conforme apelos por Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra a ocupação e colonização na Palestina histórica.
Segundo a imprensa local, a Coca-Cola vivenciou queda de 23% nas vendas em Bangladesh. Nos últimos meses, a empresa intensificou sua campanha publicitária no país — desde anúncios de página inteira nos jornais a intervenções em websites populares.
Em 9 de junho, a Coca-Cola divulgou um anúncio na televisão e nas redes sociais para contestar a percepção de que o refrigerante se trata de um produto israelense.
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O anúncio em bengali abre com um dia quente no mercado, com um rapaz se aproximando de um atendente de meia idade, que assiste em seu celular a um vídeo da Coke Studio — popular série de música promovida pela corporação em países do sul da Ásia.
“Como você está, Sohail?”, pergunta o atendente. “Que tal uma Coca?”.
“Não Bablu bhai [irmão]. Eu não bebo mais esse negócio. É ‘daquele lugar’”, responde o rapaz, em clara alusão a Israel.
O atendente contrapõe: “Veja, meninos. A Coca não é ‘daquele lugar’. Há 138 anos, pessoas em 190 países bebem Coca. Bebem Coca na Turquia, na Espanha e em Dubai. Mesmo na Palestina, tem uma fábrica da Coca”.
Então, aparentemente aliviados, bebem refrigerante.
Desinformação
O comercial foi veiculado pela primeira vez durante uma partida de críquete entre Paquistão e Índia, pela Copa do Mundo T20 realizada nos Estados Unidos e Caribe.
Logo após a transmissão, deflagrou indignação online e nas ruas.
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Hasan Habib, empresário na capital Dhaka, confirmou boicotar a Coca-Cola por Gaza e reiterou: “Essa tentativa absurda de retratar a marca como se nada tivesse a ver com Israel apenas me dá certeza de que devo continuar meu boicote”.
Um elemento em particular foi logo contradito: a fábrica da Coca na Palestina. De fato, a marca tem uma fábrica na Cisjordânia ocupada, porém no assentamento ilegal de Atarot.
“Trata-se de uma declaração absolutamente insensível e falsa”, explicou Nadia Tabassum Khan, analista de mercado na capital bengali. “É um insulto aos milhões de palestinos cujas terras são expropriadas há décadas pela violenta ocupação de Israel”.
Nesta quarta-feira (12), uma loja de sapatos veiculou um anúncio de protesto, mostrando uma garrafa de Coca sendo chutada por um homem. Abdul al-Nayan, gerente de marketing da firma, expressou solidariedade aos palestinos em conversa com a Al Jazeera.
“Como professional de marketing, aproveitei a oportunidade para formular uma propaganda de nosso produto com base nas questões em voga”, afirmou al-Nayan. “Porém, como muçulmano, condeno veementemente a Coca por mentir sobre sua conexão com Israel”.
Para Omar Nasif Abdullah, professor de publicidade da Universidade Norte-Sul de Bangladesh, observou que o anúncio mostra que a empresa “não conseguiu ler o pulso das ruas”. Para ele, a campanha é “tomada por uma mensagem errada e uma abordagem ainda pior”.
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A Coca-Cola removeu a peça de seus canais do YouTube e Facebook por cinco horas, entretanto, sem explicação. Ao devolvê-la ao ar, desativou os comentários.
Para Zahed Ur Rahman, analista político de Dakha, “a Coca é vista como uma marca americana por excelência, alvejada, portanto, sob a crença de que a pressão econômica pode persuadir os Estados Unidos — maior aliado de Tel Aviv — a intervir na matéria”.
Segundo Rahman, a percepção é comum entre o povo bengali.
Em fevereiro, a Coca-Cola vendeu suas operações de empacotamento a uma associada turca, a Coca-Cola Icecek. A empresa negou relação com a queda nas vendas.
Em contrapartida, uma marca local de refrigerantes, até então obscura, a Mojo, ganhou terreno.
Israel é réu por genocídio no Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), sediado em Haia. Em maio, a promotoria do Tribunal Penal Internacional (TPI) requereu mandados de prisão contra o premiê Benjamin Netanyahu e seu ministro da Defesa, Yoav Gallant.
Israel mantém ataques indiscriminados a Gaza há mais de oito meses, deixando 37 mil mortos e 85 mil feridos até então, além de dois milhões de desabrigados.
Neste contexto, corporações como McDonald’s e Starbucks — na lista de boicote por seu apoio operacional ao apartheid e às ações militares de Israel — sofreram prejuízos bilionários.
As ações israelenses são punição coletiva, crime de guerra e genocídio.