Era final da tarde no Brasil, quando o presidente da Bolívia, Luis Arce Catacora , denunciou uma mobilização incomum dos militares na Plaza Murillo e no Palácio Quemado, sede do governo. As atenções internacionais voltaram-se para Bolívia. Por sua vez, o ex-presidente Evo Morales alertava para um possível golpe de Estado. O pesadelo latino-americano estava de volta.
Naquele momento, tanques e forças armadas já estavam posicionados na capital, La Paz. Os militares bolivianos, sob o comando do general Juan José Zuñiga, tomaram a Plaza Murillo e entraram no Palácio Quemado para derrubar o governo de Luis Arce, cercando o gabinete presidencial. O presidente dirigiu-se ao palácio do governo determinado a impedir a passagem dos militares, enquanto as tropas sob comando do general golpista permaneciam na Plaza Murillo.
A resistência indígena boliviana, que já se levantou contra outro golpe que, em 1919, derrubou Evo Morales, emitiu um sinal de alerta à população. Organizações sociais convocaram reunião coletiva em defesa da democracia. A Central Obrera Boliviana COB, falando em nome da classe operária e campesina, a classe média, os jovens e estudantes universitários, os profissionais, intelectuais e todo o povo, denunciou a tentativa de golpe de Estado e instou os golpistas a escutarem a voz do povo e recuarem. Em seguida, declararam uma greve por tempo indeterminado para restaurar a democracia.
Enquanto isso, Luis Arce enfrentava cara a cara o general golpista dentro do palácio, dando-lhe ordem de rendição. “Não se engane, general. Respeite a democracia” – avisou, ao lado da ministra María Nela Prada, que acusou o general de tentar impor uma ditadura. A esta altura, bolivianos convocados por suas organizações já se dirigiam à Plaza Murillo em defesa da democracia , onde permaneceram à espera do presidente.
Em poucas horas, o golpe estava debelado. Arce deu posse a novos comandantes militares em substituição aos golpistas e o governo deu voz de prisão ao Juan José Zúñiga, ex-comandante do Exército, e o vice-almirante Juan Arnez, ex-comandante da Marinha, como autores da tentativa de golpe de Estado.O Ministério Público do país deu início às investigações contra todos os envolvidos.
Nas redes sociais, internautas atribuíram a tentativa de golpe à cobiça pelo lítio, especialmente após o encontro do presidente Arce com o presidente russo Vladimir Putim, em visita a Moscou no início de junho. Na ocasião, o boliviano mencionou uma parceria em curso com uma empresa russa. À agência estatal TASS ele declarou: “Ainda temos um projeto em andamento para a produção de baterias de lítio na Bolívia com uma empresa russa, e estamos esperando que o trabalho seja acelerado para que possamos também ter outra atividade e outro produto importante da cooperação entre a Rússia e a Bolívia”.
A Bolívia tem posições independentes e em relação aos Estados Unidos, a quem acusa de ter patrocinado o golpe de 2019, e faz duras críticas ao Estado de Israel, tendo rompido relações. Em janeiro, tornou-se o primeiro país da América do Sul a endossar a denúncia da Ãfrica do Sul contra Israel perante o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), pela prática de genocídio contra o povo palestino.