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O acerto de contas: Uma história da Síria moderna até a guerra civil

Família al-Assad: na primeira fileira, o falecido presidente da Síria, Hafez al-Assad, e sua esposa, Anisa Makhlouf; atrás do casal, os filhos, incluindo o atual presidente Bashar al-Assad (segundo da esquerda para a direita) [Wikimedia/Creative Commons 2.0/Reprodução]

“Ele era um homem em busca de poder. Faria qualquer coisa para conquistar seus objetivos, não importa contra quem. Mesmo um amigo íntimo seria mandado para a cadeia. Ou poderia matá-lo para exercer sua vontade”.

Muito embora Dafi al-Jamaani, ex-líder do partido Baath, que até hoje governa a Síria, esteja se referindo ao ex-presidente e general Hafez al-Assad, que comandou o país com punho de ferro entre os anos de 1971 e 2000, poderia muito certamente estar falando de seu filho e herdeiro, Bashar Al-Assad, que lançou mão de uma campanha de terrorismo de Estado, assassinato em massa e vingança contra toda a população há mais de dez anos, em uma tentativa implacável de se manter no poder.

Ainda assim, um olhar minucioso sobre a vida de seu pai, conforme os relatos que compõem Syria: The Reckoning — em português, Síria: O acerto de contas —, produção documental da rede internacional Al Jazeera, em dois episódios, dirigida pelo cineasta Suhaib Abu Doulah, torna fácil enxergar onde Bashar aprendeu a aplicar táticas tão impiedosas.

Episódio 1

Episódio 2

Devido ao fato de que os anos posteriores à independência da Síria, em relação à França, tenham sido abalados por sucessivos golpes militares, Hafez manteve hegemonia absoluta sobre o regime, na tentativa de estabilizar o país e, por inferência, seu governo. Para tanto, esmagou qualquer forma de oposição a sua figura ou ao partido Baath — ao qual se filiou em meados da década de 1940, como ativista estudantil e graduando na academia militar. Com o tempo, transformou o Baath no “partido do governo” — ou melhor dizendo, o partido único.

Mesmo antes do falecido presidente tomar o poder, Hafez integrava um pequeno grupo de oficiais militares, conhecido como “comitê militar”, incumbido de implementar um controle autoritário sobre todo o país. Com seu desejo ardente para reestruturar o Estado, a sociedade e a economia, este pequeno grupo impôs um “estado de emergência”, fechou jornais e baniu partidos e movimentos políticos como a Irmandade Muçulmana.

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A Irmandade Muçulmana logo se tornou o mais proeminente núcleo de oposição ao regime secular autoritário. Em 1964, seus ativistas tomaram as ruas do país em denúncia às ações do partido Baath, mas foram violentamente esmagados. No fim da década de 1970, militantes da Irmandade Muçulmana mão de uma campanha de atentados suicidas e assassinatos contra oficiais e correligionários alauítas — a minoria da qual faz parte a dinastia Assad.

Uma década depois, no contexto dos ataques do regime contra a cidade de Hama, na região central da Síria, Hafez ordenou a tortura e execução de membros de uma insurreição islâmica mediante um cerco de três semanas. Segundo estimativas, entre 15 mil e 30 mil pessoas foram mortas. Dado que o regime não diferenciava combatentes de civis, a maioria das vítimas do incidente era precisamente residentes civis, assassinados à medida que um terço da cidade fora destruída.

“Hama foi um dos massacres mais deploráveis da história moderna”, comenta o narrador.

Destruição da cidade de Hama, no centro da Síria, após ataques do regime de Hafez al-Assad, em 1982 [Wikimedia/Creative Commons 2.0/Reprodução]

Syria: The Reckoning leva seus expectadores a uma jornada histórica, da luta do Estado levantino por sua libertação da colonização francesa, no ano de 1946, à ascensão do nacionalismo árabe e, posteriormente do baathismo; por um quarto de século de sucessivos golpes militares; até que o então ministro da Defesa, Hafez al-Assad, tomasse o poder por vias da força, ao aniquilar seus inimigos. A obra documental da Al Jazeera conclui ao sugerir a chegada no poder de seu filho, Bashar al-Assad, no ano 2000, quando o fundador da dinastia faleceu, assim como os violentos métodos adotados pelo regime desde então.

Destruição na praça central Saadallah al-Jabiri, em Aleppo, maior cidade da Síria até então, no contexto da guerra civil, em 3 de outubro de 2012 [Wikimedia/Creative Commons 2.0/Reprodução]

Em 2011, pouco mais de uma década após o advento do governo de Bashar, protestos populares de massa eclodiram contra seu regime ditatorial, reivindicando uma transição à democracia, como parte das manifestações da chamada Primavera Árabe. Como uma contiguidade direta do legado de seu pai, Bashar lançou uma repressão brutal contra qualquer oposição nas ruas, ao empregar munição real contra a população. Quando a mera repressão não funcionou, recorreu a táticas de assassinato em massa, tortura e uso de armas químicas contra cidades inteiras, levando à devastação de todo o país e ao deslocamento à força de 2.4 milhões de refugiados ao exterior, ao custo de dezenas de milhares de vidas.

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