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Operação Belém: Em busca de embaixadores para a cidade palestina

Muro do Apartheid, construído por Israel na cidade de Belém, na Cisjordânia ocupada, em 4 de junho de 2024 [Alessandro Levati/Getty Images]

Com tudo que se diz sobre a questão palestina e as restrições de viagem impostas pela ocupação israelense na Palestina histórica, a maior parte dos comentários tende a ser realizado em termos gerais. Pouquíssimos esforços obtiveram êxito em romper o olhar estereotipado sobre a Palestina, com enfoque em uma cidade em particular e profunda história pessoal.

Isto é, até então.

Belém, cidade natal do Cristianismo, é dificilmente o termo mais pesquisado no Google quando se fala da Palestina. Contudo, para Leila Sansour, cineasta e ativista com raízes na cidade, Belém é um ponto focal para a sua narrativa. Seu filme Open Bethlehem — também conhecido como Operation Bethlehem, ou Operação Belém — não é somente mais um documentário; mas um épico de 90 minutos que transcende o cinema político ou convencional e dá a seus espectadores um ponto de vista pessoal sobre as paixões e a vida de um único personagem, comprometido em conquistar um futuro melhor para seus concidadãos.

Filmado ao longo de mais de uma década, o filme conta a história da filha da principal professora da cidade, falecida, que ajudou a fundar e construir o ambicioso projeto que se tornou um dos maiores institutos de ensino superior da Palestina contemporânea, a Universidade de Belém.

Open Bethlehem é tanto um filme quanto um chamado à ação. É um daquelas obras de documentário raras em que o público é levado adentro das residências, em uma cidade cercada por todos os lados por blocos de cimento e o Muro do Apartheid — maior do que o infame Muro de Berlim. Ao levar o público a uma jornada pessoal, Leila Sansour os mobiliza a se tornarem embaixadores da cidade sitiada.

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Nascida em Moscou, de pai palestino e mãe russa, Leila e seu irmão, Maxim, conferem à cidade antiga de Belém um senso de credibilidade e perspectiva. Ao tentar combater o feio e opressivo cimento instalado pelas autoridades ocupantes por todos os lados da cidade, Leila e sua prima Carol têm uma ideia: criar um “passaporte de Belém” e usá-lo para buscar embaixadores honorários em todo o mundo. Em evento Amã, na Jordânia, a cineasta comentou que adoraria chegar a um milhão de embaixadores. Armados com um poderoso documentário sobre o que acontece em Belém, o intuito, conforme seu relato, é que os embaixadores tomem as ruas dos Estados Unidos — o maior aliado de Israel — para transmitir uma mensagem de que é urgente desobstruir e abrir as portas da cidade de Belém.

O filme contém cenas fortes de trabalhadores aglomerados em pequenos corredores, cercados por soldados armados, aguardando desde as três horas da madrugada, para que sejam processados por um labirinto de arbítrios militares de Israel, para chegarem aos seus postos de trabalho, do outro lado do muro. As cenas poderiam instigar toda e qualquer pessoa com consciência a ponderar sobre as necessidades urgentes do povo palestino, em geral, e de Belém, em particular, ao encapsular a própria essência do que é viver sob ocupação.

Soldados israelenses obstruem a passagem de cidadãos palestinos em um checkpoint militar de Belém, na Cisjordânia ocupada, em 14 de abril 2023 [Hazem Bader/AFP via Getty Images]

O enfoque em Belém, em vez de Jerusalém ou Ramallah, tem sentido. Se os obstáculos enfrentados pela busca palestina por seus direitos básicos e seu Estado independente podem ser resolvidos através da comunidade internacional, parece fundamental mover corações e mentes de cidadãos americanos, predominantemente cristãos, submetidos às inclinações ideológicas do sionismo cristão, mas que pouco compreendem o que se passa com seus irmãos de fé, árabe-palestinos, na cidade natal de Cristo.

Leila Sansour é uma palestina de Belém com uma voz poderosa, embora gentil, e uma mensagem notavelmente apaixonada. A política e a realidade da cidade que a diretora defende pode não parecer direta em um contexto no qual o mundo acusa de extremo um grupo particular de pessoas; contudo, o fato de que as esperanças palestinas sejam esmagadas — inclusive materialmente — em nome de uma outra religião antiga parece ecoar a matéria do fundamentalismo.

As dificuldades e tribulações da vida que seu personagem único passa por todo o filme, para documentar as violações israelenses contra os sonhos palestinos, se projetam em um documentário de sucesso que se converteu em um sucesso de críticas e conquistou premiações. Open Bethlehem, no entanto, vai além: é uma das reflexões mais trágicas, embora mais apaixonadas, do que acontece na Palestina há décadas, diante dos olhos de todo o mundo, apesar da contundente omissão ou distorção da imprensa global. É uma obra esperançosa, por vezes triste, por vezes feliz, que bem personifica a questão palestina.

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Após ver Open Bethlehem, não é possível ficar parado. Uma mensagem poderosa se faz necessária, refletida nos esforços de um ser humano que busca levar o mundo a juntar-se a seus apelos. Portanto, temos de dizer, em alto e bom som: Abram Belém! Palestina livre!

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