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Alternativity: A Belém de Banksy e Danny Boyle

Walled Off Hotel, projeto do artista conceitual Banksy, junto ao Muro do Apartheid, em Belém, na Cisjordânia ocupada, em 22 de dezembro de 2022 [Jakub Porzycki/NurPhoto via Getty Images]

Promovido como algo a trazer um pouco de festividade à cidade palestina de Belém, o lugar onde nasceu Jesus Cristo, o muito antecipado documentário do artista conceitual Banksy, Alternativity, chegou à televisão através do canal britânico BBC2, em dezembro de 2017. Ao traçar a jornada do cineasta Danny Boyle e seus parceiros locais, na busca por realizar a versão de Banksy da história da natividade, a obra combina componentes natalinos familiares com uma realidade menos conhecida, da vida sob o olhar de uma torre militar.

A história começa quando Danny Boyle, diretor aclamado internacionalmente por trás de Trainspotting e Slumdog Millionaire (Quem quer ser um milionário?), chega de avião a Tel Aviv, a pedido de Banksy. Recebido por Wisam Salsaa, gerente do The Walled Off Hotel — projeto de Banksy com a “pior vista do mundo”, para o Muro do Apartheid, em Belém, na Cisjordânia —, Boyle observa que o mais próximo que já esteve a Palestina e Israel, ou ao Oriente Médio, foi provavelmente em Mallorca. Ao ponderar sobre a vista de sua janela, a brutalidade do muro logo se impõe. Ao associá-lo a pregos no chão — “cruéis e brutais” —, fica claro que Boyle está somente começando a compreender as dimensões dos desafios em mãos.

Com Banksy presente apenas como um conceito — via cartas misteriosas, telefonemas a Salsaa e storyboards desenhados à mão do que imagina ser Alternativity —, Boyle se vê forçado a procurar um codiretor para administrar as tarefas diárias de elaborar uma peça infantil. Salsaa sugere Riham Isaac, professora local de dramaturgia. Apesar de se mostrar atordoada pelo convite, Isaac explica que, embora conheça e goste do trabalho de Banksy, quando o hotel foi inaugurado, ela e muitos outros manifestaram ceticismo por uma exposição aparentemente superficial sobre o turismo, sem mudar, no entanto, a realidade em campo.

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Ao tentar navegar sobre o fio da navalha, Boyle decide criar e produzir uma peça que fale por si mesma. Ao considerar os temas de jornada — ou viagem — como inerentes às tradições da natividade, Boyle tenta manter sua Alternativity tão próxima da versão original quanto possível. Ao crer que impor sua própria história sobre um espaço onde o movimento é tão limitado seria paternalista, Boyle mostra consciência de sua própria posição como um estrangeiro que vê e registra a uma realidade diária sobre a qual ele mesmo e seus espectadores jamais realmente refletiram.

Embora a narrativa seja, por vezes, simplista na maneira de explicar o contexto político e histórico na Palestina, a fim de atrair um público mainstream e conquistar um horário no domingo nas televisões britânicas, essa falta de didática não deve minimizar a dura missão que Boyle, Banksy, Isaac e Salsaa se propõem a materializar, ao produzir uma peça que busca refletir uma história humana da cidade que vive sob a violenta sombra de um símbolo de opressão, divisão e desumanização.

As crianças que estrelam em Alternativity se orgulham em mostrar à equipe do filme a casa de suas famílias e apresentar suas mães ao mundo exterior. Elisa, uma menina alta e magra com uma voz angelical, atordoa a todos logo no primeiro ensaio, ao cantar o nascimento do Menino Jesus e proclamar à câmera que adoraria interpretar o papel de Maria. Sofia, que viria a interpretar um dos cordeiros, insiste em ensaiar apesar de seu pai ter sido preso por Israel, acusado de integrar a Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), no campo de refugiados de Dheisheh, ao sul de Belém.

Conforme se aproxima a data da estreia, Salsaa trabalha incansavelmente para cumprir uma das principais demandas de Banksy: que haja neve na cidade de Belém no dia da peça. Salsaa decide misturar isopor e massa branca a serem derramados das varandas do hotel. A “neve” que cai sobre familiares, amigos e visitantes conforme se desenrola Alternativity é uma imagem simples, mas que aquece o coração.

O narrador reafirma: “Jesus nasceu aqui para trazer paz a toda a humanidade. Vamos dizer que seu trabalho ainda não acabou”. Apesar das violações que seguem nas terras ocupadas da Palestina histórica, lugar onde nasceu Jesus, a vida continua.

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