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O projeto internacional de cooperação municipal dos BRICS

O presidente Lula discursa diante de líderes dos países do BRICS e de convidados na plenária ampliada em Joanesburgo. [ Ricardo Stuckert / PR]

A agenda da política externa russa é apresentada pela mídia hegemônica brasileira tendo como base campanhas militares e confrontações territoriais. Ao contrário do que tentam nos apresentar, a Rússia é incentivadora da agenda dos BRICS, entrelaçando as iniciativas do Kremlin e sua chancelaria com a projeção econômica liderada por Beijing e seus países aliados. Dentro deste conjunto de iniciativas – sobre os quais costumamos escrever e analisar aqui – apontamos mais uma, dessa vez voltada para a paradiplomacia.

De 27 a 28 de agosto de 2024, o Fórum IMBRICS, o 6º Fórum Municipal Internacional dos países do BRICS, foi realizado no Expocentre em Moscou. Se trata de mais um esforço de softpower vindo da Rússia, realizando eventos a partir do eixo de desenvolvimento aurasiático e voltado ao Sul Global e tem a chancela dos países fundadores do bloco Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul, a soma de Estados emergentes consolidados cujo PIB já ultrapassa o do G7+1.

Segundo o site oficial do Fórum, a autodefinição é essa:

“O Fórum Municipal Internacional do BRICS é uma plataforma importante para a troca de experiências e ideias entre representantes de governos regionais e municipais dos países BRICS, bem como para a construção de comunicações empresariais eficazes com empresários da Rússia e de outros países parceiros. O evento é apoiado pela Administração Presidencial e pelo Ministério das Relações Exteriores da Rússia, bem como pela Agência Federal “Rossotrudnichestvo” e pelo Governo de Moscou.

Por decisão de Yuri Ushakov, Assistente do Presidente da Federação Russa, o Fórum IMBRICS está incluído no Plano de Ação da Presidência da Federação Russa na Associação Interestadual do BRICS em 2024 (parágrafo 147).

Em 2022, o Fórum IMBRICS foi incluído no texto da Declaração de Pequim da XIV Cimeira do BRICS (parágrafo 70) e é designado como um mecanismo significativo para promover o desenvolvimento urbano e estabelecer ligações entre cidades geminadas dos países BRICS no âmbito do Agenda de Desenvolvimento Sustentável até 2030.”

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Este evento é uma plataforma importante para a troca de experiências e ideias entre representantes dos governos regionais e municipais dos países BRICS, bem como para a construção de contatos comerciais eficazes com empresários na Rússia e outros países parceiros. Ou seja, dentro espectro das relações internacionais, ocupa o espaço da paradiplomacia. Esta se realiza quando governos subnacionais (no caso da divisão administrativa brasileira são municípios e estados) entram em relação entre si (como na política de cidades gêmeas) ou então entre estas unidades e países soberanos.

Como parte de sua estratégia de projeção de poder para além da massa continental onde está instalada, a Federação Russa escalou um estafe de peso considerável para comparecer ao evento. As autoridades participantes foram representantes dos órgãos legislativos e executivos da Rússia, vários diretores de centros e órgãos comunitários russos, convidados dos países do BRICS e de vários outros países.

A fins de ilustração, podemos observar a presença das seguintes pessoas em posições de poder e tomada de decisão:

O vice-presidente da Duma Estatal da Assembleia Federal da Federação Russa, Boris Aleksandrovich Chernyshov; a Diretora do Departamento de Política de Estado na Esfera da Educação, Educação Complementar e Recreação Infantil do Ministério da Educação da Rússia Natalya Valentinovna; o Diretor da Instituição Educacional Orçamentária do Estado Federal “MCD Artek” Konstantin Albertovich Fedorenko; o Presidente da Fundação Alyosha, Aleksey Vladimirovich Zinoviev; a Vice-Presidente do Conselho do Primeiro Movimento (ala juvenil pró Putin), Sonya Grigoryevna Pogosyan; a Diretora do English Camp, Sandra Goulart Urioste (Brasil); o Presidente da ONG canadense International Camping Fellowship (ICF) Fahrettin Gozet (Turquia); e o Presidente do Conselho do Instituto de Educação em Acampamentos da China, Nie Aijun.

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Os palestrantes fizeram apresentações, compartilharam suas experiências na organização do campo de atividade em questão e também discutiram iniciativas atuais para expandir as atividades do movimento camp e da educação não formal, inclusive nos países do BRICS. A lógica que gere esse tipo de evento é a competição direta com o movimento de intercambistas. Os EUA definem que um estudante de intercâmbio no ensino médio pode se tornar um enterno e voluntário embaixador esadunidense. Esta é a definição do próprio senador James William Fulbright (democrata do Arkansas, segregacionista, militarista e um operador do softpower do imperialismo) e anima os programas de intercâmbio do Império, aliciando jovens de todo o mundo, com especial atenção para as elites latino-americanas e asiáticas.

Dentre os temas abordados no Fórum, destacamos os seguintes eixos temáticos:

“Desenvolvimento económico dos territórios BRICS: o papel crescente das megacidades e a sua atratividade de investimento; Intermunicipal Internacional; Energia futura. Tecnologias Inovadoras para eficiência energética nas cidades e regiões do BRICS; Novo modelo de desenvolvimento sustentável no formato BRICS; Educação e Ciência; Cooperação interparlamentar entre capitais e cidades do BRICS; Projetos digitais e tecnologias de TI; Cultura e Esporte; Indústria. Desenvolvimento tecnológico; Transporte e logística; Juventude do futuro. Potencial, áreas de oportunidade dentro do BRICS.”

A compreensão subjacente destas temáticas é o alinhamento dos recursos municipais – de megacidades ou de consórcios metropolitanos – e a consequente oferta de soluções tecnológicas baseadas nos sistemas informacionais russos, chineses e indianos. Evidente que o Sistema BRICS deve avançar em condições de financiamento de projetos para urbanização sustentável, como o que foi realizado na Nona Reunião Anual do Novo Banco de Desenvolvimento. O conjunto dos projetos atualmente sendo financiados pelo NBD (também conhecido como Banco dos BRICS) pode ser consultado neste link. Se o volume de transações do comércio internacional sem o uso do dólar seguir ampliando, é possível que mais recursos sejam alocados nas intervenções municipais do Fórum dos BRICS, materializando os debates como os citados acima.

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A intervenção da professora Sandra Goulart Urioste e a linha de intercâmbio Sul Sul 

No âmbito do fórum, foi realizada uma mesa redonda sobre o papel da educação extracurricular e da cooperação internacional entre jovens. Houve a discussão da experiência de cidades e municípios dos países BRICS no campo da educação extracurricular.

A coordenadora do Acampamento de Jovens (gerido em língua inglesa), Sandra Gourlat Urioste (brasileira) observou no seu relatório que os programas de intercâmbio internacional permitem que crianças e jovens tenham acesso a uma vasta gama de serviços educativos que vão além do seu contexto local. Estas experiências promovem a consciência cultural, a tolerância e um sentido de cidadania global, que são essenciais nas sociedades multiculturais modernas.

Urioste também enfatizou que, ao longo dos anos, a cooperação internacional atraiu líderes, observadores e amigos de vários países, como México, Rússia, Mongólia, África do Sul, Nova Zelândia, Inglaterra, Estados Unidos, Arábia Saudita, Suécia e outros, para o Acampamento  em língua inglesa inglês (que ela dirige). Obviamente que o instrumento dos intercâmbios pode facilitar  – e muito – a formar uma geração de jovens intelectuais de países membros dos BRICS, de Estados asiáticos e do chamado Sul Global, escapando da hegemonia cultural estadunidense, anglossaxã e pró ocidental.

Uma das maiores carências de potências médias – a exemplo do Brasil – é formar camadas pensantes de uma estratégica nacional de médio e longo prazo. Infelizmente é tamanha a presença da “cultura” dos EUA que a projeção de si da classe média e das frações de classe dominante sequer é brasileira. O andar de cima do país – e da América Latina – se vê como um endinheirado de Miami e não como alguém dotado de responsabilidade histórica no desenvolvimento de nosso território. Se os eventos dos BRICS ajudarem a reverter esse sinal de fraqueza do país, já serão de grande contribuição; para além dos mais que necessários projetos estruturais de urbanização e meio ambiente.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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