O ataque deliberado das forças israelenses contra jornalistas na Cisjordânia ocupada nesta semana expõe – caso ainda não tenha ficado evidente o bastante – a face brutal e sistemática de uma política que não conhece limites morais, tampouco legais. Tamanha agressão se revela como uma tentativa descarada de silenciar a verdade e seus emissores. Não há outra explicação para o disparo direto de veículos blindados contra seres humanos claramente identificados como profissionais de imprensa, a não ser que essa seja a política oficial de seu regime.
Cento e sessenta e cinco jornalistas assassinados em dez meses não representa apenas assassinato, mas o agravante de um assassinato sumário, cuja licença para matar vem diretamente de um governo acostumado com a impunidade de seus crimes. Esta não é uma exceção – é a regra.
A imprensa livre é o inimigo mais temido de qualquer força de ocupação, e no caso do que temos presenciado nos últimos meses – ou melhor, nos 76 anos de ocupação, que coincidentemente é o mesmo período da existência de leis internacionais em defesa da liberdade de imprensa – essa força, reconhecida, torna-se motivo para punir todo e qualquer profissional de imprensa.
O freak show sionista desta semana foi a tentativa de assassinato de sete jornalistas, dentre eles Ayman al-Nobani, Muhammad Mansour e Raneen Sawafta. Não foi apenas um ataque físico – foi uma maneira de brindar a barbárie, e, para toda a comunidade internacional, que já condenou inúmeras vezes os mesmos crimes hediondos, uma declaração de “não nos importamos com suas leis e seus direitos humanos”. É como uma piada que repete “estamos acima do bem e do mal”.
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São 165 jornalistas martirizados e tantas outras centenas de feridos. Não se trata de balas perdidas, mas de um projeto muito bem calculado, que visa tanto o corpo quanto a mensagem emitida, alta e clara, e diz “a ocupação não quer testemunhas, muito menos evidências.”
Quando as forças de ocupação interceptam ambulâncias e cercam hospitais para interrogar jornalistas feridos, o que vemos não é uma tática militar – é o medo desesperado de controlar a narrativa assassinando seus emissores e tentando apagar a memória coletiva que esses mesmos registram diariamente, na qual, de um lado, se apresenta o oprimido que resiste e, na outra ponta, o opressor – que deveria se envergonhar de sua própria imagem refletida no espelho.
Enquanto o mundo assiste em silêncio, a ocupação acelera suas estratégias de censura pela força, sabendo que o silêncio internacional é o seu maior aliado. A cumplicidade das grandes potências e da mídia hegemônica não é apenas vergonhosa – ela é tão criminosa quanto. Afinal, o que mais precisa acontecer para que se reconheça o genocídio em curso, disfarçado de “operações militares”? O sangue dos jornalistas, socorristas, médicos, mulheres e crianças é apenas mais um capítulo desse massacre contínuo, legitimado pelo aval das instituições globais que gritam pelos direitos humanos, mas apenas pelos seus.
O que ocorreu em Kafrdan e em Jenin nos últimos dias não é um incidente isolado – é parte de uma guerra muito maior contra a documentação dos fatos, contra qualquer tentativa de resistência e, principalmente, contra aquilo que nos torna humanos: a memória.
Matar jornalistas é a tática de um regime que sabe que não tem argumentos válidos para sustentar sua agressão. A pergunta que fica é: até quando o mundo vai continuar a aceitar essa narrativa falsa e fingir que não vê a brutalidade com que a ocupação lida com a verdade? Talvez seja hora de reconhecer que a luta pela Palestina não se dá somente no campo de batalha, mas também no campo das ideias e das palavras – e, neste campo, a ocupação dispara sua única munição: a violência.
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