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Mapeamento das linhas falhas

Autor do livro(s) :Kilic Bugra Kanat
Data de publicação : 18 de abril de 2024
Editora :Editora Bloomsbury
Número de páginas do Livro :328 páginas
ISBN-13 :9780755650767

As relações entre os EUA e a Turquia são muitas vezes tensas e desconfortáveis, parece que Washington e Ancara desconfiam um do outro, mas também estão em uma aliança. A Turquia é membro da OTAN e está em uma posição geoestratégica importante do ponto de vista dos Estados Unidos, enquanto os EUA são um importante aliado e parceiro comercial de Ancara. Como devemos entender a complexidade das relações entre os EUA e a Turquia? Este livro tem como objetivo nos oferecer uma perspectiva historicamente informada, mapeando o relacionamento turbulento entre Ancara e Washington, começando no final do período otomano no século XIX e terminando com a guerra Rússia-Ucrânia em 2022.

Kilic Bugra Kanat argumenta que um dos problemas com os estudos existentes sobre as relações entre os EUA e a Turquia tende a se concentrar apenas em episódios específicos, épocas específicas ou crises particulares. Além disso, essa abordagem tende a tratar crises específicas como desconectadas de crises anteriores, o que tira do analista a capacidade de mapear padrões e tendências mais amplos. “Uma análise minuciosa dos desafios das relações bilaterais exige um estudo com um período de memória mais longo para identificar os padrões e as falhas.”  Mapping the Fault Lines in Turkey-US relations: Making the Vulnerable Partnership é a tentativa de Kanat de preencher essa lacuna.

O livro é dividido em cinco capítulos, sendo que cada um deles se concentra em uma área específica e a mapeia ao longo da história. Isso inclui capítulos sobre a opinião pública, o Congresso dos EUA, a Rússia, a Síria e o Iraque, o Irã e Israel. Cada uma dessas áreas produz sua própria linha falha e a compreensão de como esses diferentes elementos nos permitirão entender melhor como as relações entre os EUA e a Turquia chegaram ao ponto em que se encontram hoje e nos darão uma visão de onde elas podem chegar no futuro.

A influência de lobbies, especialmente armênios e gregos, sobre a tomada de decisões dos EUA é bastante proeminente nas discussões sobre os laços entre Ancara e Washington. O estudo oferece uma visão dos diferentes fatores de pressão e atração que moldam o relacionamento entre eles. Já o capítulo sobre opinião pública oferece uma visão interessante sobre como isso afeta a política. Eu acrescentaria que algo que aparece no capítulo é um mal-entendido sobre o significado da opinião pública por um dos lados e sobre a ideia de que os dois lados não são iguais. O argumento de Kanat parece ser o de que não há um sentimento antiamericano generalizado entre os turcos, mas sim uma frustração em relação a políticas específicas, ao passo que o antiturquismo generalizado existe de fato na sociedade americana.

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Um exemplo disso foi o lançamento do filme turco Valley of the Wolves, em 2006. O filme, que se passa no Iraque após a invasão dos EUA, retrata os soldados americanos de forma desfavorável, com cenas em que eles massacram civis e termina com as forças turcas matando os americanos. O lançamento do filme disparou o alarme em Washington, pois foi visto como prova de antiamericanismo extremo na Turquia. “Os comandantes militares dos Estados Unidos emitiram avisos para garantir a segurança do pessoal americano nos países sempre que esse filme ou outras histórias semelhantes fossem exibidas.” Embora fosse verdade que a opinião pública sobre os EUA estivesse bastante fraca devido à invasão do Iraque pelos EUA, como Kanat argumenta, “o antiamericanismo na Turquia era mais frequentemente uma rejeição pública da atitude e das políticas dos EUA em relação à região e à Turquia e raramente gerava uma forte pressão sobre os formuladores de políticas estrangeiras”.

Ele contrasta esse fato com o dos EUA, onde o sentimento antiturco generalizado pode se infiltrar na tomada de decisões no Congresso em épocas de maior tensão. As origens desse fato podem ser atribuídas aos anos 1800 e aos escritos orientalistas que retratam a Turquia como atrasada, incivilizada e bárbara, tropos que surgem de várias formas em diferentes momentos da história.

Outra faceta interessante é o papel que o congresso desempenha nas relações entre os EUA e a Turquia. Em diversos momentos, a Casa Branca opta por adotar uma abordagem de incentivo a Ancara e oferecer assistência mais próxima, venda de armas e comércio em geral, mas o Congresso acaba bloqueando ou obstruindo parte dessa assistência, aumentando assim as tensões entre os países.

“Nos últimos cinquenta anos, as tensões se intensificaram, pois o Congresso desafiou repetidamente as administrações presidenciais democratas e republicanas. O Congresso assumiu um papel cada vez maior na formação da natureza das relações bilaterais entre os dois países”, explica Kanat. A adoção de atitudes mais hostis por parte do Congresso em relação à Turquia em diferentes momentos foi, muitas vezes, um reflexo da frustração em relação a certos eventos e esforços por parte dos lobbies armênios e gregos. No entanto, o relacionamento nem sempre é ruim e, como o livro mostra, há ciclos de relações quentes e frias.

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Mapping the Fault Lines esclarece as questões do relacionamento entre os EUA e a Turquia empregando um modelo histórico para mapear as áreas de discórdia. A visão de longo prazo que ele oferece nos permite compreender melhor as tendências e o contexto em que as decisões de política externa são tomadas. É uma leitura necessária para quem procura uma introdução construtiva e abrangente a uma das relações mais importantes do Oriente Médio. Os formuladores de políticas, políticos, jornalistas, acadêmicos e o leitor leigo encontrarão algo para eles.

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