No século XIII, os mongóis, sob a formidável liderança de Genghis Khan, varreram as vastas estepes da Ásia Central, causando uma devastação sem precedentes à medida que avançavam em direção ao Oriente Médio. Sua conquista culminou com o catastrófico saque de Bagdá em 1258, que levou à queda do califado abássida e mergulhou grande parte do mundo islâmico em tumulto.
Para a Pérsia, em particular, o domínio mongol foi descrito por cronistas e historiadores, do passado e do presente, como “um dos períodos mais sombrios da história iraniana”. As cidades foram destruídas e as populações dizimadas. No entanto, como Denise Aigle revela em seu último trabalho, Iran under the Mongols: Ilkhanid Administrators and Persian Notables in Fars, esse período não foi apenas de destruição e desespero.
A pesquisa anterior de Aigle já havia desafiado a visão unidimensional do domínio mongol no Irã, sugerindo que os mongóis, com o tempo, tornaram-se mais do que meros conquistadores; eles se integraram gradualmente à sociedade persa, adotando e adaptando as práticas administrativas locais. Agora, com vinte anos de estudos adicionais, a autora atualizou seu trabalho, refinando ainda mais sua tese e oferecendo uma compreensão mais detalhada dos governantes mongóis e seus súditos iranianos, com foco especial na província de Fars e sua estimada capital Shiraz.
Ao contrário das conquistas árabes transformadoras do século VII, a invasão mongol, embora tenha causado estragos, não teve um impacto profundo sobre “os fundamentos culturais e religiosos da sociedade iraniana”, como observa Aigle: “O Irã ainda permaneceu um país muçulmano mesmo depois de décadas de domínio não muçulmano, já que os mongóis não impuseram uma nova religião”.
O argumento central do livro é que o governo mongol, embora inicialmente caracterizado pela brutalidade, acabou levando ao estabelecimento de um sistema administrativo duplo que envolvia funcionários mongóis e persas. Sob o Ilkhanate (um estado semiautônomo sob o grande Império Mongol), também foi fundado um sistema judicial duplo, que aplicava a lei islâmica e a lei mongol.
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Foi devido à falta de experiência administrativa dos governantes nômades que esse sistema administrativo surgiu. Ao se concentrar em Fars, Aigle esclarece as complexidades da administração local e as compara com as províncias vizinhas, como Kirman. De acordo com a autora, o declínio econômico em Fars durante esse período não se deveu apenas ao desgoverno mongol, mas também foi influenciado significativamente pelas ações egoístas das elites locais, que muitas vezes contribuíram para a instabilidade da região.
Essas ocorrências têm semelhanças impressionantes com os mamelucos e seu governo; eles eram os soldados escravos que acabariam revertendo a expansão mongol na fatídica Batalha de Ayn Jalut, na atual Palestina. O Irã sob o domínio dos mongóis é repleto de traições e intrigas na corte, em que o leitor se depara com inúmeros casos de “lutas fratricidas” e “hostilidades interfamiliares” entre as várias dinastias rivais governadas por seus senhores mongóis.
O impacto cultural e religioso mais amplo do domínio mongol no Irã também é explorado. Aigle refuta a visão simplista dos mongóis como destruidores da cultura islâmica, mostrando, em vez disso, como eles acabaram se tornando patronos da arte, da arquitetura e do aprendizado islâmicos. De fato, vários governantes mongóis se converteram ao islamismo, como Ghazan Khan, o fundador do Ilkhanate islâmico.
A personalidade intrigante do irmão de Ghazan, Oljeitu, é mencionada em partes por Aigle. Entretanto, uma discussão mais detalhada sobre seu impacto e influência teria sido benéfica. Depois de passar por várias conversões religiosas, Oljeitu acabou adotando o islamismo xiita Twelver, tornando-se o primeiro governante a estabelecê-lo como a religião do Estado no Irã. Ele até tinha a ambição de construir um grande mausoléu para servir de santuário para o Imam Ali e o Imam Hussein, planejando transferir seus restos mortais de seus locais de descanso no Iraque. No entanto, esses planos nunca se concretizaram e Oljeitu acabou sendo enterrado no próprio mausoléu. Esses detalhes não constam do livro, mas a autora observa que Majd Al-Din Ismail Fali, uma autoridade religiosa altamente respeitada, desafiou “a imposição de Oljeitu do xiismo como religião do Estado”.
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Em resumo, o leitor descobre que os mongóis mantiveram seu controle e sua soberania sobre a rica província de Fars principalmente por meio de impostos. No entanto, contra esse pano de fundo, o livro oferece um relato rico e detalhado das manobras políticas e das disputas de poder entre a população local durante um período de significativa agitação social.
Com uma variedade vertiginosa de nomes e personalidades, a perspectiva equilibrada fornecida pela autora oferece uma compreensão mais profunda do governo mongol no Irã. Isso torna o livro uma leitura essencial para qualquer pessoa interessada nessa era crucial da história islâmica após a queda dos abássidas.