O que as greves em Israel dizem sobre a derrota do regime de Netanyahu?

Confrontos entre manifestantes e policiais em Tel Aviv no dia 5 de setembro marcaram o 4° dia seguido de protestos na capital israelense. Os protestos exigem um cessar-fogo com os grupos militares palestinos.

De forma a pressionar o governo, os manifestantes protestaram em frente às residências de 8 ministros de Estado diferentes.

Esses protestos ocorrem de forma mais intensa desde o dia 2 de setembro, quando o sindicato israelense Histadrut convocou uma greve geral em Israel.

No mesmo dia da greve, um grupo de manifestantes foi até a casa do primeiro-ministro e derrubou as cercas de segurança, levantadas justamente por conta do aumento dos protestos anti-Netanyahu em Israel.

A greve promete atingir aeroportos, universidades, hospitais e unidades de saúde. O sindicato Histadrut concentra, por conta das políticas corporativistas aplicadas pelo estado de Israel, cerca de 90% de todos os trabalhadores do território ocupado.

A mobilização marca um novo passo da sociedade israelense contra o regime de Netanyahu. O motor dessa luta é o fracasso de Netanyahu em conseguir vitórias na guerra de agressão a Gaza sobre as quais possa se erguer e mobilizar os moradores do território ocupado.

Derrota em todos os campos

Os dez meses de guerra debilitaram o Estado de Israel nos campos econômico, militar e político.

A economia israelense caiu até mesmo nas agências de crédito alinhadas ao Estados Unidos, como a Fitch Ratings – que reduziu a nota do Estado de A+ para A. O Banco de Israel calcula que os gastos com a guerra entre 2023-2025 podem somar U$ 55,6 bilhões.

No dia 3 de setembro, já em meio a greve geral, o ministro das Finanças Bezalel Smotrich, admitiu que “estamos na guerra mais longa e cara da história de Israel, com cerca de NIS 200 bilhões a NIS 250 bilhões (US$ 54 bilhões a US$ 68 bilhões) em custos diretos”.

LEIA: Quanto custa o genocídio palestino para os cofres da ocupação?

As Forças Armadas e policiais do Estado sionista continuam a sofrer baixas nas frentes de Gaza, Norte (contra o Hezbollah) e mesmo na Cisjordânia, onde três policiais foram mortos por uma operação palestina no dia 1° de setembro. Dois dias depois, o comandante de operações terrestres do Exército de Israel, Major General Tamir Yadai, renunciou.

O próprio presidente do sindicato Histadrut, Arnon Bar-david, disse que Israel está “em uma espiral descendente, e não paramos de receber sacos para cadáveres”. As mentiras e subestimação dos dados de Israel não podem mais esconder as derrotas.

Em termos políticos, a crise institucional em Israel se aprofunda com os ataques cada vez mais escancarados dos membros do governo entre si. No mesmo dia que a greve foi decretada, o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, afirmou que a política de Netanyahu de priorizar o domínio do Corredor da Filadélfia acima da troca de prisioneiros é uma “vergonha moral”.

Todo esse cenário, é claro, impulsiona as greves e protestos de rua em Israel, porque escancaram que o governo israelense está longe de chegar a uma solução militar para a guerra e, com o governo tão dividido, um acordo político fica mais difícil de ser consolidado. Tudo isso prolonga os problemas econômicos do Estado.

Sabotagem ao cessar-fogo 

Um outro ponto importante é que os moradores do território ocupado percebem cada vez mais que Netanyahu não quer um acordo de cessar-fogo.

LEIA: EUA dizem que a rejeição do cessar-fogo é desnecessária, Israel está seguro sem o Corredor Filadélfia

Uma nova comprovação disso foi a publicação no jornal israelense Yedioth Ahronoth de uma reportagem que mostrou que, em julho passado, o governo israelense preparou um documento para boicotar deliberadamente o cessar-fogo com a Resistência Nacional Palestina.

O documento foi preparado pelo ministro das Finanças Bezalel Smotrich, que avaliou que o líder do Hamas Yahya Sinwar poderia aceitar o acordo proposto. Dessa forma, um outro documento, com a revisão da posição de Israel em torno do corredor da Filadélfia e a reabertura de outras discussões foi colocado na mesa em cima da hora, levando ao fim das discussões.

Israel noticiou que o Hamas não quis o acordo, mas agora a verdade veio à tona.

Reversão de crescimento 

O cenário de mobilizações é importante porque representa uma frustração ao crescimento de popularidade que Netanyahu teve nos últimos meses.

O primeiro-ministro conseguiu reverter parcialmente o quadro de desmoralização ao propagandear o assassinato dos líderes do Hezbollah e Hamas, Fouad Shukr e Ismail Haniyeh respectivamente, como vitórias, e usar as operações do Estados Unidos e outras potências contra o movimento Ansar Allah no Mar Vermelho como propaganda.

O resultado foi que, se eleições tivessem ocorrido no dia 9 de agosto, o partido Likud, de Netanyahu, teria sido o maior no Knesset, um fato inédito desde o 7 de outubro, segundo pesquisa do jornal monopolista israelense Maariv.

Alguns fatos recentes podem ter revertido mais uma vez este cenário, piorando a imagem de Netanyahu.

O primeiro foi a realização de operações de martírio em Tel Aviv por grupos como o Hamas e a Jihad Islâmica Palestina, que explodiram um caminhão-bomba na capital de Israel no dia 18 de agosto.

LEIA: 61% dos israelenses não confiam em Netanyahu sobre a guerra, revela pesquisa

O segundo foi a escolha rápida, pelo Hamas, de um novo líder para substituir Haniyeh, numa demonstração de que a morte do antigo líder não abalou as fileiras do movimento.

O terceiro, que é reflexo do segundo, foi a manutenção e mesmo incremento das operações palestinas na Faixa de Gaza e na Cisjordânia.

O quarto foram as novas operações do Ansar Allah contra navios petroleiros no Mar Vermelho nas últimas duas semanas, que desmoralizou as propagandas norte-americanas-sionistas sobre supostos êxitos na região.

Manejo político 

A Resistência Nacional Palestina, por sua vez, atua no cenário com impecável manejo político, tornando a situação ainda mais favorável para si.

O porta-voz das Brigadas Al-Qassam, Abu Obeida, avisou Israel na segunda-feira sobre os custos de tentar resgatar prisioneiros de guerra através de ações militares.

Após o incidente de Nuseirat, novas instruções foram emitidas aos combatentes designados para proteger os prisioneiros sobre como lidar com eles caso o exército de ocupação se aproximasse do local de detenção, revelou Abu Obeida, na declaração.

Ele se refere à operação israelense que resgatou quatro prisioneiros de guerra na cidade de Nuseirat, e deixa claro que situações como essas não vão voltar a acontecer. 

LEIA: A história registrará que Israel cometeu um holocausto

Netanyahu e o exército de ocupação são os únicos responsáveis ​​pelas mortes dos prisioneiros, pois obstruíram deliberadamente qualquer acordo de troca de prisioneiros por interesses mesquinhos, além de matar intencionalmente dezenas deles por meio de ataques aéreos diretos, defende ele.

A declaração é forte e tem potencial para aumentar os protestos em Tel Aviv, ainda mais com as provas reveladas pelo Yedioth Ahronoth de que, de fato, o regime israelense boicotou os acordos.

E conclui: “A insistência de Netanyahu em libertar os cativos por meio de pressão militar em vez de fazer um acordo significará seu retorno às suas famílias em caixões. Suas famílias devem escolher: ou mortos ou vivos.  

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

Sair da versão mobile