Escritor libanês Elias Khoury morre aos 76 anos

Faleceu na manhã deste domingo, 15 de setembro, o romancista e professor Elias Khoury, um dos mais renomados escritores libaneses e contundente defensor da causa palestina, aos 76 anos de idade.

Khoury — uma das principais vozes da literatura árabe contemporânea — estava doente e passou por diversos hospitais ao longo do último ano, informou o jornal Al-Quds Al-Arabi, para o qual trabalhava.

Fontes próximas à família confirmaram seu falecimento à Agence France-Presse (AFP).

No decorrer das décadas, Khoury produziu diversas obras em árabe, incluindo romances, contos e peças, sobre temas como memória coletiva, guerra e exílio.

Além de seus escritos publicados, deixou artigos em diversos jornais, lecionou literatura e editou uma publicação ligada à Organização para a Libertação da Palestina (OLP).

Suas obras foram traduzidas a numerosos idiomas, incluindo português, francês, alemão, inglês, espanhol, italiano e mesmo hebraico.

Um de seus livros mais conhecidos, Porta do Sol (1998), foi lançado no Brasil pela editora Record, em 2008, com tradução de sua conterrânea Safa Jubran, professora livre docente no Departamento de Letras Orientais da Universidade de São Paulo (USP).

Porta do Sol conta a história de refugiados palestinos expulsos de suas casas em 1948, na ocasião da Nakba, ou “catástrofe”, quando foi criado o Estado de Israel mediante limpeza étnica planejada.

LEIA: Por que estudar Israel–Palestina ameaça as elites ocidentais?

A obra foi adaptada a um filme homônimo de longa-metragem — em árabe, Bab el Shams —, lançado em maio de 2004 no Festival Internacional de Cannes, com direção do egípcio Yousry Nasrallah.

“A catástrofe começou em 1948 e continua até hoje”, escreveu Khoury, ao então se referir à expansão dos assentamentos ilegais israelenses na Cisjordânia e em Jerusalém.

Khoury também escreveu sobre a guerra civil no Líbano (1975–1990), em romances como Yalo: O filho da guerra, publicado em 2002, traduzido ao português em 2012.

Sobre a Primavera Árabe, onda de levantes populares que destituíram as ditaduras árabes de Zine el-Abidine Ben Ali, na Tunísia, e Hosni Mubarak, no Egito, a partir de 2011, reiterou Khoury: “A questão não é porque os árabes se revoltam. A questão não é como os árabes derrubaram a barreira do medo, mas como o medo alicerçou tantos reinos de silêncio por cinco décadas seguidas”.

Sua obra mais recente Crianças do gueto — também referente à Palestina — compreende uma trilogia cuja primeira edição, Meu nome é Adam (2016), foi lançada no Brasil em 2022 pela editora Tabla, traduzida por Jubran.

 

Nascido em Beirute, em 12 de julho de 1948, Khoury estudou na Universidade Libanesa e, mais tarde, em Paris, onde conquistou seu doutorado em história social. Desde jovem, se mostrou um firme apoiador do povo palestino.

Khoury foi coeditor da revista Shu’un Filastiniyya (Assuntos palestinos), ligado à OLP, entre 1975 e 1979, junto do poeta Mahmoud Darwish.

Khoury chefiou ainda a seção de cultura do jornal libanês As-Safir, descontinuado, assim como o suplemento cultural do diário Annahar.

Lecionou literatura na prestigiosa Universidade de Columbia, em Nova York, nos Estados Unidos, recente epicentro de protestos e acampamentos contra o genocídio israelense na Faixa de Gaza sitiada.

Em 9 de outubro, dois dias após a chamada operação Tempestade de Al-Aqsa, que cruzou a fronteira de Gaza a Israel e capturou colonos e soldados, Khoury escreveu um artigo ao Al-Quds Al-Arab, no qual contextualizou a crise.

LEIA: O massacre de acadêmicos palestinos em Gaza é uma tática israelense deliberada

“A maior prisão a céu aberto do planeta, o gueto sitiado de Gaza, rebelou-se contra Israel, seus assentamentos, e forçou colonos a fugir”, comentou o autor.

Seus problemas de saúde nos últimos anos não o impediram de produzir diversos artigos, compartilhados em sua página do Facebook de sua cama de hospital.

Em 16 de julho último, publicou um artigo intitulado Um ano de dor, em tradução livre, no qual relatou não apenas sua doença como “uma vida de dores, que cessam somente para anunciar mais e mais dores”.

Khoury construiu, contudo, um paralelo: “Gaza e a Palestina sofrem bombardeios brutais há quase um ano, mas continuam resilientes e inabaláveis — um modelo que me ensinou a amar a vida dia após dia”.

Sair da versão mobile