O que será de nós, árabes?

O projeto imperialista para destruir o mundo árabe está ocorrendo sob o olhar espantado e atordoado do mundo inteiro, com a conivência de muitas nações árabes, que ainda não percebem o quanto procuram, com isso, a própria ruína!

Bagdá, Damasco, Jerusalém e Beirute já foram símbolos de uma cultura árabe exuberante e riquíssima, na encruzilhada das civilizações, palcos vivos de uma simbiose abraâmica onde os minaretes, os campanários e as cúpulas das sinagogas entremeavam seus cantos sagrados com o burburinho melodioso dos Souks (mercados árabes), frequentados por árabes cristãos – maronitas, melquitas, jacobitas, siríacos ou caldeus – e por muçulmanos – sunitas, xiitas ou carijitas –, sem falar das mil e uma correntes do esoterismo muçulmano, dos drusos, alauitas, circassianos e dos curdos que também viviam nesse pequeno universo chamado Oriente Médio, ouvindo e entoando as doces melodias de Oum Kalsoum, Farid El Attrach, Mohammed Abdelwahab, Fairuz ou Warda El Jazairya, entre outros cantores e cantoras árabes que eram motivo de orgulho e alegria para esses povos, dando-lhes a sensação, de Casablanca a Saná, de pertencerem ao mesmo mundo.

Contudo, esqueceu-se de contar com o Ocidente imperialista, que voltou a se comportar como no pontificado de Urbano II, quando o papa predicava à nobreza cristã que lutasse contra os turcos que ameaçavam o Império Bizantino e resgatasse os locais sagrados ocupados pelos muçulmanos.

O mesmo Ocidente que, soberbamente, já havia se apropriado de uma religião cristã nascida no Oriente, cujos templos no Líbano, Síria, Egito, Iraque e Palestina testificam as origens do paleocristianismo oriental – hoje sob as bombas da fera sionista, que já não brande uma espada para destruir, e sim, altas tecnologias que conduzem ao pleno urbicídio dessas cidades de luz. O termo urbicídio foi usado pela primeira vez em 1963 pelo escritor Michael Moorcock no romance de ficção científica “heroic fantasy”, mas adquiriu um novo significado geopolítico na década de 1990, quando foi usado pelo arquiteto e ex-prefeito de Belgrado Bogdan Bogdanovic em referência às cidades de Sarajevo, Vukovar e Mostar para designar a destruição de uma cidade “não como um objetivo estratégico, mas como um objetivo identitário”.

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É por isso que o que está acontecendo em Gaza e na Cisjordânia não pode ser descrito apenas como genocídio, mas também como palestinocídio, porque o urbicídio que o acompanha visa erradicar todos os vestígios de civilização e da presença palestina na Palestina e que sempre caracterizou as operações israelenses desde 1948 em aldeais palestinas como Iraq El Suwaidan, Iqrith ou Kfar Birham entre milhares: destruir, matar e queimar arquivos. O sionismo não tem memória, apenas amnésia (os outros não contam ou não existem) e hipermnésia (ao evocar o holocausto, extermínio entre outros como centralidade do mundo moderno).

Porque é disto que se trata: o peão do Ocidente não é mais personificado por Godofredo de Bulhão ou Ricardo Coração de Leão, mas pelo incomparável Benyamin Mileikowski, também conhecido como Netanyahu, um Adolf Hitler sem prepúcio, um pouco de Varsóvia, um pouco de Brooklyn. Como seus antecessores franceses e britânicos, esse Gargantua asquenaze quer se apossar de todo o Oriente Médio – e, por que não, do mundo árabe –, engolindo-o por inteiro.

O palestinocídio em curso está contaminando a Terra dos Cedros, ora afetada e infectada pela destrutiva bactéria sionista-ocidental, que vem varrendo tudo em seu caminho: prédios, escolas, igrejas, mesquitas, hospitais, universidades e, é claro, os povos. Uma solução final endossada pelos Estados Unidos, pela União Europeia e por árabes traiçoeiros, que não estão nem aí. O que estamos esperando? Quem estamos esperando? E, acima de tudo, o que faremos a respeito do palestinocídio, do libanocídio e do arabocídio total que desponta no horizonte? Porque é disso que se trata!

Que a agonia dos palestinos e libaneses leve ao triunfo dos árabes… Dos árabes? Eu duvido! Enquanto isso, estou ouvindo a mítica canção Wayne Al Malayin’ (Onde está o povo árabe?), escrita pelo poeta Ali Al-Kilani e pelo compositor Abdullah Muhammad Mansour, da Líbia.

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A guerra civil libanesa começou em 13 de abril de 1975, após o metralhamento de um ônibus que transportava palestinos de volta a Sabra, um campo de refugiados… Foi durante o conflito que Ali Muhammad Al-Kilani al-Gaddafi, primo do falecido líder líbio Muammar Gaddafi, decidiu escrever uma música para homenagear os palestinos massacrados em 1982.

Lembre-se bem desta letra:

Onde estão os milhões? Onde estão os milhões?

Onde está o povo árabe?

Onde está a revolta árabe?

Onde está a dignidade árabe?

Onde está o sangue árabe?

Onde está a honra árabe?

Onde estão os milhões?…

( E sobre os sionistas, a canção continua:)

… Eles enforcam, matam, enterram, colocam nossos filhos em sepulturas

Não será fácil tomá-la, terra minha

Meu sangue vermelho conta o verde da terra

Amargo como um limão…

50 anos após a guerra civil libanesa, essas palavras ainda ecoam em nossas mentes… 50 depois… a morte continua!

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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