O sionismo é a extrema-direita latino-americana

O ex-presidente do Brasil Jair Bolsonaro discursa durante a Conferência Anual de Ação Política Conservadora (CPAC) no Gaylord National Resort & Convention Center em 4 de março de 2023 em National Harbor, Maryland. [Alex Wong/Getty Images]

Se existe uma evidência nas relações políticas latino-americana é a fusão de interesses entre o sionismo praticado em nossos países e a extrema direita. O conjunto probatório vai do traidor Nayib Bukele (presidente reeleito com fraude em El Salvador) até o convertido Javier Milei (o ultraliberal que faz de seu desgoverno um posto avançado sionista). Se formos analisar país por país, em alguma medida a política externa do Apartheid, em uma fusão de interesses com o Império Estadunidense, se faz presente buscando tanto influenciar como coagir os mandatos presidenciais eleitos. Vejamos dois exemplos extremados, Brasil e Argentina.

A CONIB é o palanque da direita brasileira

O presidente da Confederação Israelita do Brasil (CONIB), o médico Claudio Lottenberg, é um entusiasta das práticas reacionárias brasileiras. Antes um grande propagandista de Jair Bolsonaro, agora abandona o neofascista à própria sorte e se aproxima de outras lideranças. A celebração com neofascistas e outras estrelas do “pós bolsonarismo” foi em um evento reunindo cerca de 400 convidados para um jantar da Confederação Israelita do Brasil (Conib), na sede do clube A Hebraica, em São Paulo, na noite do último sábado (23 de novembro).

Conforme divulgado no portal UOL, em matéria de Juliana Sayuri , a direção da maior entidade sionista brasileira recebeu expoentes que apoiam o bolsonarismo, portanto, relativizam os intentos de golpes de Estado (ou não se pronunciam a respeito).  Estavam presentes na cerimônia os governadores Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Ronaldo Caiado (União Brasil -GO) e Claudio Castro (PL-RJ).

Infelizmente nós – árabe-brasileiros – não deixamos de passar vergonha com o evento. O anfitrial e médico do Conselho do Hospital Alberto Einstein Lottenberg abriu o evento cumprimentando os políticos presentes, entre eles, Gilberto Kassab (PSD), a quem se referiu como “um dos maiores mestres da política”. Tal como as Forças Libanesas e seu líder Samir Geagea; além do passado horroroso dos Tigres de Chamoun, o Exército de Lahad ou o Exército do “Líbano Livre”, Kassab opera como um intermediário entre os piores interesses neofascistas atuando no Brasil e o sionismo sem cinismo, modelo “100% sincero” (ao estilo de Ariel Sharon e Bibi Netanyahu). Como um “hábil politiqueiro” distribui suas cartas, posicionando o PSD como um aliado tanto do governo como do pós-bolsonarismo. É o “primeiro ministro” do neofascista e aliado estratégico sionista Tarcísio de Freitas.

Vale lembrar que o governador de Goiás Ronaldo Caiado – junto de Tarcísio de Freitas – visitou os Territórios Ocupados de 1948 em março deste ano. Na ocasião, além de adularem ao premiê do Apartheid acusado de genocídio, Caiado também esteve com o presidente dos colonos, Issac Herzog. A visita se deu no auge da crise diplomática entre o Estado Colonial e a República Federativa do Brasil, escalando o frisson pelas redes sociais e as declarações do chanceler sionista, seu embaixador no país, e os já citados presidente e premiê dos genocidas.

Além dos governadores acima citados, o jantar teve presença de diversos políticos de direita. Participaram o prefeito Ricardo Nunes (MDB), o presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil), o senador Carlos Viana (Podemos-MG) e a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP). O ministro do STF André Mendonça também estava entre os convidados.

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A citada parlamentar da extrema direita é a mesma que puxou uma arma na véspera da eleição de 2022, quando estava em grupo e teve áspera discussão com um jornalista negro em São Paulo capital. A parlamentar – surpreendentemente ainda não cassada – é a mesma que pediu para que generais quatro estrelas não reconhecessem o resultado das eleições. Na mesma ocasião demanda um golpe de estado. Nada aconteceu, nem mesmo foi alvo do Conselho de Ética da Câmara. Pelo visto a direção da CONIB apoia -ao menos tacitamente – esse tipo de conduta.

O ministro André Mendonça, pastor presbiteriano, foi a indicação “terrivelmente evangélica” realizada por Bolsonaro para a Suprema Corte. Quando finalmente foi ratificada sua aprovação no Senado, a então primeira dama saiu comemorando em “línguas estranhas”.

Em janeiro deste ano, Mendonça viajou para o Estado Colonial sob auspícios da CONIB e da rede de propaganda de extrema direita Stand With Us. A viagem foi revelada pelo jornal O Globo e o próprio ministro postou em suas redes sociais que viajou para o país. Em setembro de 2023, tanto André Mendonça como Kassio Nunes Marques, ambos ministros indicados por Bolsonaro para o STF, rejeitaram a tese de golpe de Estado quando do julgamento dos eventos de 08 de janeiro de 2023. A tese da conspiração do então governo recém-empossado contra seu próprio governo, foi repetida desta forma pelo convidado de Claudio Lottenberg e devidamente rebatida em plenário por Alexandre de Moraes.

Milei e seu convênio com o Estado Sionista

O presidente argentino Javier Milei embora não tenha uma origem em comunidade de fé judaica, parece ter realmente se convertido ao judaísmo como uma forma de expressão – segundo ele – do sionismo. Ou seja, a apropriação de uma religião por uma ideologia colonialista encontra uma fortaleza no ex-economista que se tornou conhecido por fazer debates bizarros sobre sexo tântrico na TV de seu ex-patrão Eduardo Eurnekian (América TV).

Após passar um verdadeiro vexame no G20, Milei retoma a sua rotina de subalternidade e devoção ao Apartheid na Palestina Ocupada. No encontro das vinte maiores economias do mundo (mas com presença efetiva de 81 delegações), ele ameaçou não assinar a resolução final do encontro voltando atrás logo na sequência de duas reprimendas que levou (do Brasil e da China). Agora o líder de extrema direita que atende pelo apelido de Jamoncito (presuntinho) solta outra pérola de subordinação ao ocidente.

Na quinta feira 21 de novembro, aquele que foi responsável pela falência fraudulenta de um fundo de previdência complementar (Máxima AFJP), participou do encontro empresarial promovido pela Embaixada de Israel na Argentina e a Câmara de Comérico Argentina-Israelita. O evento se deu na cidade de Buenos Aires (capital federal). Na ocasião fez um um pronunciamento buscando uma aliança estratégia entre a República Argentina e o Estado do Apartheid Colonial na Palestina Ocupada. Vejamos trechos de seu discurso:

“Estamos avançando com um memorando histórico com o governo israelense, uma aliança bilateral entre duas nações irmãs, em defesa da liberdade e da democracia na luta contra o terrorismo e as ditaduras. Enquanto os Kirchneristas fizeram um memorando com o Irã, nós estamos fazendo um com Israel”.

“É nosso desejo que essa aliança entre Argentina e Israel se torne um modelo para que outras nações do mundo livre também escolham a vida e a liberdade, condenando firme e abertamente o terrorismo. Estamos avançando em um memorando histórico com o governo israelense, uma aliança bilateral entre duas nações irmãs, em defesa da liberdade e da democracia em combate ao terrorismo e às ditaduras.”

“Eles (o governo Kirchner) assinaram pactos espúrios de silêncio e cumplicidade com o crime, nós sancionamos alianças com nossos semelhantes em defesa da justiça e da liberdade. É nosso desejo que essa aliança entre Argentina e Israel se torne um modelo para que outras nações do mundo livre também escolham a vida e a liberdade, condenando firme e abertamente o terrorismo. Mostramos que Israel é, junto com os Estados Unidos, nosso parceiro político mais importante.”

“Gostaria de agradecer à embaixada de Israel na Argentina e à Câmara de Comércio Argentino-Israelense por essa honrosa distinção e estou realmente orgulhoso de ser reconhecido como um Prêmio de Liderança de Israel. Acredito que, neste momento, já demonstramos não apenas a afinidade natural que este governo tem com o povo de Israel, mas também a convicção inabalável de acompanhar, ajudar e trabalhar em conjunto com o Estado de Israel, sempre que possível.”

“Nesse sentido, gostaria de destacar a Wiagro, vencedora do Prêmio de Inovação de Israel. Também gostaria de agradecê-los por me convidarem para este evento que reúne os mais importantes empresários de ambos os países para reconhecê-los, promover o progresso de seus projetos e contribuir para o aprofundamento de nossas relações comerciais”. 

Ou seja, de modo cabal, o presidente do terceiro maior parceiro comercial do Brasil afirma com todas as letras que não lhe importa o interesse pragmático e sim o alinhamento junto aos poderes ocidentais. O pronunciamento daquele que também foi economista sênior do HSBC (que curiosamente decidiu liquidar suas operações no país, em abril de 2024) vai ao encontro da escolha do seu novo chanceler, conforme já escrevemos neste mesmo portal. Não custa lembrar quem é

Em 17 de novembro o Comitê Argentino de Solidariedade ao Povo Palestino realizou um ato público em Buenos Aires e deixou ainda mais evidentes os vínculos com o imperialismo e o sionismo os quais o presidente do país faz questão de exacerbar. O pronunciamento do Comitê merece atenção:

“Da mesma forma, repudiamos o alinhamento cada vez mais flagrante do governo de Javier Milei com os Estados Unidos e Israel. Como parte deste cargo, Gerardo Werthein, agente do sionismo e empresário bilionário que era até agora, não por coincidência, embaixador argentino em Washington, foi nomeado nestes dias para chefiar o Itamaraty. Na sua figura, portanto, concentra-se a orientação ultrarreacionária da política externa de Milei. Denunciamos também o envio de soldados à Força Marítima Unitária para controlar o Mar Vermelho sob o comando dos Estados Unidos.”

Milei decidiu pela substituição de Diana Mondino por Werthein, un milionáro empresário com então apenas cinco meses de experiencia diplomática atuando justamente como embaixador em Washington. Cabe observar que o sionista escolhido tem como profissão de origem a medicina veterinária). Uma das metas atribuídas pelo presidente foi “identificar aos diplomatas traidores e os inimigos das agendas da liberdade”.

O alinhamento é tamanho que ao demitir a ex-chanceler Diana Mondino por ter comandado a delegação argentina na Assembleia Geral da ONU votando uma resolução contra o bloqueio a Cuba (tal decisão foi corroborada apenas por EUA e Israel), Milei assim declarou:

“Eles (os que votaram contra o bloqueio) são traidores da pátria, vamos expulsá-los e fazê-los pagar. Esse gesto não apenas custou o emprego de Mondino (a votação sobre Cuba), mas todos os responsáveis serão resumidos e demitidos. Eles vivem uma vida parasitária. Eu havia definido que meu alinhamento era com os Estados Unidos e Israel, tínhamos que estar lá. Por isso, o erro imperdoável de Mondino lhe custou o cargo em 30 minutos”.

Relações carnais e presença sionista no Cone Sul

Como nos explica o pesquisador José Victor Ferro, as relações carnais são uma herança da pior etapa da Era Menem, quando a política externa argentina era pura subordinação:

Em termos de política exterior, Milei, como fez Menem há mais de 30 anos atrás, é partidário do estabelecimento de relações especiais com Washington. Menem, foi protagonista da política em relação aos Estados Unidos, que, segundo o infame termo usado por seu chanceler Guido di Tella (1991-1999), ficou conhecida como “relações carnais”, pois consistia em um alinhamento político quase automático para a obtenção de vantagens econômicas – como o investimento estrangeiro direto e, sobretudo, o apoio nos organismos multilaterais de crédito, necessários para o êxito do Plano de Convertibilidade. As “relações carnais” com os Estados Unidos, além de virem acompanhadas das políticas liberalizantes defendidas pelo pólo hegemônico central, era igualmente derivado das reflexões de um grupo de acadêmicos, cujo maior expoente foi Carlos Escudé e sua teoria do realismo periférico.

Desta vez não há “necessidade” de alugarem um grupo de especialistas em busca de patrocínio e benesses. O empenho da propaganda diversionista e informações falsas através de plataformas e redes sociais manipuladas pelos algoritmos já fazem o serviço. Na relação “carnal” entre a extrema direita latino-americana e os operadores sionistas, destacamos neste texto ao Brasil (através da CONIB e os herdeiros do bolsonarismo) e o desgoverno Javier Milei e sua coleção de absurdos. O problema é de fundo e ultrapassa a caricatura e o grotesco. Quase todo convênio desta ordem implica em aumentar a penetração do Estado Colonial e seu aparelho de segurança dentro das estruturas repressivas de nossos países. Como viemos dizendo repetidamente, o inimigo genocida está aqui, está entre nós.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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