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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Batalha pelo direito à informação na Palestina é desafio de morte

Mais um jornalista assassinado em Gaza, o cameraman Saed Abu Nabhan, que atuava como freelancer para a Agência Anadolu [Agência Anadolu]

“O massacre de jornalistas em Gaza deve acabar. A eliminação […] ameaça criar um apagão total da mídia no enclave bloqueado. Esses ataques têm como alvo não apenas a imprensa palestina, mas o direito do público internacional à informação confiável, livre, independente e plural de uma das zonas de conflito mais vigiadas do planeta. Exigimos proteção para os jornalistas de Gaza, o fim da impunidade e que jornalistas estrangeiros tenham acesso à faixa. Nosso direito à informação está em jogo.”

Assim o diretor-geral dos Repórteres sem Fronteiras (RSF), Thibaut Bruttin, se manifestou em 26 de setembro último, durante um dia de protestos relâmpagos realizados pela organização ao redor do mundo em homenagem aos jornalistas assassinados pelas forças de ocupação israelenses em Gaza.

Naquele momento, a RSF falava em 130 desses profissionais que perderam a vida no exercício de sua função. Em 31 de dezembro de 2024, a Al Jazeera apresentou uma estimativa de pelo menos 221, nos 15 meses de genocídio, listando seus nomes como homenagem àqueles e àquelas que foram alvo na batalha pela verdade e direito à informação. Ou seja, 70% a mais em apenas três meses, o que revela o intento de Israel que alertou Bruttin: a busca por apagão da mídia em Gaza.

O momento em que o jornalista palestino Saed Abu Nabhan foi morto a tiros por um atirador israelense no campo de refugiados de Nusairat, no centro da Faixa de Gaza.

Neste 10 de janeiro, o Comitê para Proteção de Jornalistas (CPJ) informava sobre a profissão de alto risco na estreita faixa e em toda a Palestina ocupada, o que tem incluído prisões e tortura (75 passaram pelos cárceres até a data, sendo três do capataz sionista, a Autoridade Palestina), ataques cibernéticos e agressões, censura e ameaça, além do assassinato de toda a família em Gaza para punir quem segue a transmitir ao mundo o próprio genocídio.

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Como exemplos, mencionou os casos do jornalista Wael al-Dahdouh, chefe do escritório da Al Jazeera, que perdeu inclusive a esposa, filhos e neto em um bombardeio sionista cujo alvo era sua residência, além do fotojornalista Yasser Quqih.

Difamado pela organização sionista HonestReporting em 8 de novembro de 2023 como “terrorista” – como todo o seu povo palestino –, este último foi ameaçado de morte e teve, cinco dias depois, oito membros de sua família assassinados quando quatro mísseis atingiram sua casa no sul de Gaza.

“O gabinete do primeiro-ministro israelense postou na plataforma de mídia social X que os fotógrafos eram cúmplices de ‘crimes contra a humanidade’, e o membro do gabinete de guerra israelense Benny Gantz disse que eles deveriam ser tratados como terroristas. Grandes veículos de mídia, incluindo a Reuters, rejeitaram as alegações e a HonestReporting posteriormente retirou as acusações”, destacou o CPJ. Mas o intencional estrago mortal estava feito.

Essa entre tantas outras mentiras tem sido usada por Israel para silenciar jornalistas e seguir em sua carnificina que já deixou pelo menos 300 mil palestinos mortos – a maioria mulheres e crianças.

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Em 26 de dezembro último, um veículo devidamente identificado como de imprensa foi alvejado por um míssil israelense às portas do Hospital Al-Awda e cinco jornalistas da rede Al Quds – Faisal Abu Al Qumsan, Ayman Al Jadi, Ibrahim Al Sheikh Khalil, Fadi Hassouna e Mohammed Al Lada’a – foram assassinados. Jadi esperava o nascimento de seu primeiro filho, que nasceu no mesmo dia, já órfão de pai. Seu irmão, o fotógrafo Omar al-Jadi documentou a morte de seu ente querido a poucos metros de distância. A violência da ocupação genocida assume várias formas, todas tenebrosas e inimagináveis.

Responsabilizar a mídia

Em sua propaganda de guerra contra o povo palestino, a chamada “grande mídia” brasileira apressou-se a divulgar o fato com o argumento sionista: eram “terroristas” disfarçados. Nem mesmo a morte de seus colegas levou, 15 meses depois de um morticínio transmitido ao vivo, a uma inflexão na cumplicidade com o genocídio.

A batalha pela verdade segue e ela deve se inspirar na resistência inclusive dos comunicadores palestinos, que não silenciam. Deve ainda envolver jornalistas, seus sindicatos e organizações de defesa da democratização das comunicações na luta por responsabilização daqueles veículos e dirigentes que optaram pela distorção, omissão, silenciamento e justificativa ao genocídio de viés orientalista. Isso está previsto na Justiça brasileira, em tratados e convenções internacionais.

Há precedentes históricos, em que dirigentes de mídias locais foram devidamente condenados pela incitação ao crime contra a humanidade. É o que aconteceu em relação ao genocídio em Ruanda no ano de 1994. Ferdinand Nahimana, fundador da Rádio Télévision des Milles Collines (RTLM), Hassan Ngeze, editor-chefe do jornal Kangura, e Jean-Bosco Barayagwiza, também da RTLM, foram condenados em 2003 no tribunal internacional específico a prisão por incitarem o genocídio. Os dois primeiros pegaram perpétua; o último, 35 anos. Outro caso emblemático é da condenação à forca em 1946, no Tribunal de Nuremberg, de Julius Streicher que publicada o jornal Der Stürmer como parte da máquina de propaganda nazista para o holocausto.

O banco dos réus aguarda também a mídia sionista e seus satélites ao redor do mundo.

LEIA: O genocídio de Gaza e os limites da propaganda israelense

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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