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Mais boas-vindas às comunidades do ódio

25 de janeiro de 2025, às 09h16

Logotipo da Meta na tela de um celular em frente à tela do computador com o logotipo da Meta em Ancara, Turquia, em 7 de dezembro de 2023 [Ahmet Serdar Eser – Agência Anadolu]

De outubro de 2023 ao final de 2024, o Arab Center for the Advancement of Social Media (7amleh) contabilizou mais de 15 milhões de postagens em hebraico incitando contra os palestinos. Ao mesmo tempo, a censura  graçou  sobre conteúdos pró-Palestina, conforme detectado pelo mesmo instituto.

O site Middle East Eye registrou queixas de sites como Arabs48, Ask Jerusalém e relatos de 20 Influenciadores palestinos  que tiveram suas páginas ou canais suspensos ou prejudicados.

A distorção aparece também na cobertura “amiga” de Israel, dependendo de onde é feita. A BBC registrou uma queda acentuada do engajamento público em seus conteúdos quando produzidos diretamente na Cisjordânia e em Gaza. Já o canal Palestine TV, com 5,8 milhões de seguidores no Facebook, perdeu  60% das visualizações. Cobrir diretamente as operações israelenses levou à execução de mais de duas centenas de jornalistas palestinos e as redes também se aliam ao silenciamento, restringindo o alcance das notícias de campo.

A nova política da Meta para o Facebook e Instagram nos Estados Unidos não muda parâmetros que já vem adotando no Oriente Médio. Algoritmos continuam modulando as redes conforme os alinhamentos ideológicos das bigtechs.   Mas a pergunta do momento é o que muda quando o trabalho de checagem  é transferido das agências de verificação para as comunidades das próprias redes. É inocente imaginar que exista algum propósito regulatório nisso.

O ódio nas redes sociais deu poder à extrema direita, mas enfrentou uma resistência orgânica que impediu a reeleição de Trump em 2020, a de Bolsonaro em 2022, e expôs os crimes de  Israel à execração internacional. Também gerou convencimento de que as redes sociais precisam de regras, tarefa assumida por legisladores em vários países do mundo. E esse é o grande  receio das bigtechs, conforme admitiu Zuckerberg:  “A única maneira de resistir a essa tendência global é com o apoio do governo dos EUA”.

As corporações de tecnologia se juntaram a Trump após uma bem sucedida revanche eleitoral movida pela raiva, bravatas autoritárias e supremacistas. Dobrar a aposta e deixar o ódio e as fakenews se propagarem com liberdade, sem freio a mensagens racistas,  sexistas ou criminosas dará amplitude a comunidades extremistas e maior poder de fogo para stalkear o contraditório – e inclusive demonizar esforços regulatórios.

Ao anunciar o fim dos serviços de checagem, o dono da META disse que o novo sistema nos EUA vai se basear na fórmula da plataforma X, de Elon Musk, pioneiro em defender a livre circulação das fake news, e que optou pelas   chamadas “notas da comunidade” para avaliar conteúdos.

No caso do X, as notas da comunidade são inseridas de forma oculta abaixo das postagens, em campos preenchidos por internautas inscritos e autorizados pela plataforma com eventuais críticas aos conteúdos. Esses usuários também avaliam as notas de outros internautas inscritos no sistema e as classificam como  “úteis” ou “inúteis”. O resultado, após cálculos algorítmicos, determina se a nota crítica à postagem se torna pública ou não.  O modo com a meta vai funcionar ainda será conhecido. Mas fica por conta da maioria dos inscritos representar o pensamento hegemônico da rede. Não existe linha vermelha para o lixo.

Zuckerberg diz que as novas regras valerão apenas para os Estados Unidos, mas mandou recados em seu vídeo sobre a decisão para muito além das fronteiras norte-americanas, deixando clara a intenção de interferência política nas leis nacionais. “A Europa tem um número cada vez maior de leis, institucionalizando a censura e dificultando a construção de qualquer coisa inovadora lá”, disse ele sobre o continente que já tem algumas leis protegendo direitos na internet.

Ele também reafirmou uma notícia falsa criada pelo empresário Elon Musk, da rede X, quando foi enquadrado pela justiça brasileira: “Os países latino-americanos têm tribunais secretos que podem ordenar que as empresas retirem as coisas silenciosamente”, repetiu o dono da META. Sobre a China, disse que o país  censurou aplicativos de sua rede.

Desde o início de 2023, a Meta vem abolindo restrições à direita – começando por devolver as contas de Trump suspensas após os atentados no Capitólio – e aumentando a censura a conteúdos que considera sensíveis, como as postagens de autoridades não ocidentais e pró-Palestina. Em 2024 foi acusado de suspender, de postagens do presidente da Malásia à conta do presidente do Irã.

Quando o cessar-fogo começou no domingo (18), celebrações em páginas palestinas também foram derrubadas temporariamente como impróprias.

Até onde as fissuras antifacistas conseguirão esgarçar esse tecido de proteção da extrema direita que vem recebendo costura reforçada das bigtechs, a história não deve tardar em responder. Até lá, o ódio e suas variações políticas nas redes sociais estão convidados a se sentir em casa.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.