O ex-ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant, admitiu emitir ordens para atacar Gaza apesar de alertas de que as operações culminariam na morte de prisioneiros de guerra israelenses em custódia dos grupos de resistência.
Em entrevista ao jornal em hebraico Yedioth Ahronoth e à emissora israelense Canal 12, declarou Gallant: “Após os eventos de 7 de outubro [de 2023] e antes da invasão por terra, em 27 de outubro, tive alertas de que os reféns em Gaza poderiam morrer caso procedêssemos com os ataques. Escolhi, porém, realizar a operação por terra”.
“Eu disse ao premiê Benjamin Netanyahu que compartilhávamos somente um coisa com o Hamas — queríamos que os reféns continuassem vivos”, acrescentou Gallant. “Eles os viam como vantagem; nós, como nossa gente”.
No entanto, reconheceu: “Não fizemos tudo que podíamos para libertar os reféns”.
Em seguida, o ex-ministro confessou instruir suas tropas a implementar a Diretiva Hannibal, que envolve matar prisioneiros junto de seus captores.
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Gallant, todavia, pediu uma investigação sobre os fracassos militares e de inteligência do governo e das instituições em 7 de outubro e no período posterior.
Apesar de alguns oficiais israelenses admitirem responsabilidade sobre o incidente e a crise, Netanyahu se nega a fazê-lo e obstrui a formação de uma comissão de inquérito em causa própria, com receios de que incorra no colapso de seu governo.
Gallant reiterou que o ministro das Finanças e militante colonial, Bezalel Smotrich, foi responsável por obstruir um acordo de troca de prisioneiros em mais de uma ocasião, ao ameaçar implodir o governo em Tel Aviv.
Segundo Gallant, o mesmo acordo em voga desde 19 de janeiro poderia ter sido assinado em julho de 2024, com menos danos à imagem e à dissuasão de Israel.
Sobre o ex-ministro de Segurança Nacional, Itamar Ben-Gvir, Gallant admitiu que suas reiteradas invasões à Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém ocupada, foi um dos fatores de escalada e incitação que resultaram na crise de 7 de outubro.
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Para o ex-ministro da Defesa, ao contrário dos apelos de lideranças israelenses, seria danoso estabelecer assentamentos em Gaza — ilegais conforme a lei internacional — porque é “quase impossível” impor domínio militar sobre o enclave.
Em novembro, após meses de divergências públicas, Netanyahu exonerou Gallant para substituí-lo por Yisrael Katz, chefe do partido Nova Esperança.
Gallant e Netanyahu compartilham, no entanto, mandados de prisão do Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, por crimes de guerra e contra a humanidade perpetrados sob seu comando na Faixa de Gaza.
Israel manteve ataques indiscriminados a Gaza, até o cessar-fogo, a partir de 7 de outubro de 2023, em retaliação e punição coletiva a uma ação transfronteiriça do movimento Hamas, que capturou cerca de 200 colonos e soldados.
O exército colonial alega que 1.200 pessoas foram mortas na ocasião — número sob escrutínio, todavia, por evidências de “fogo amigo” divulgadas pelo jornal israelense Haaretz, com ordens gravadas de líderes armados para assumir a Diretiva Hannibal e impedir a tomada de reféns.
Em Gaza, as ações de Israel deixaram 47 mil mortos, 111 mil feridos e dois milhões de desabrigados, investigadas como genocídio pelo Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), que julga Estados, sob denúncia sul-africana deferida em janeiro de 2024.
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