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A quais interesses servem os planos para a Faixa de Gaza?

5 de março de 2025, às 12h00

Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, durante coletiva de imprensa na Casa Branca, em Washington DC, em 4 de fevereiro de 2025 [Celal Günes/Agência Anadolu]

Embora o plano do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para levar à cabo os esforços de limpeza étnica contra os palestinos de Gaza e criar sua “Riviera do Oriente Média” tenha sido, em ampla maioria, rechaçado pelo restante do planeta, a proposta do Egito permanece sobretudo sem resposta. O que se destaca dos poucos detalhes a que temos acesso, até então, é a insistência em eliminar o movimento Hamas da arena política.

“Não haverá recursos internacionais consideráveis para reabilitação e reconstrução de Gaza caso o Hamas permaneça como um elemento dominante político e militar, com o controle da governança local”, reportou a Reuters.

O plano vislumbra a criação de uma Missão de Governança Assistida para substituir o Hamas em Gaza. Para preencher a lacuna na segurança local, o plano prevê a formação de uma Força de Estabilização Internacional com participação dos Estados árabes, a ser regulada por um conselho global que inclua países árabes e islâmicos, Estados Unidos, Reino Unido, União Europeia e seus Estados-membros. A Autoridade Palestina também parece ter sido descartada pelo plano do Cairo.

O Hamas, contudo, não aceitará qualquer ingerência estrangeira em Gaza. 

“O Hamas rejeita quaisquer tentativas de impor projetos ou qualquer forma de gestão não-palestina, ou a presença de forças estrangeiras, nas terras da Faixa de Gaza”, disse Sami Abu Zuhri, oficial sênior do movimento palestino.

A Autoridade Palestina, que fez sua presença ser sentida durante o genocídio ao flertar com lideranças ocidentais para tomar controle de Gaza, objetou igualmente a ausência de representatividade palestina. Um oficial anônimo afirmou à Reuters que um acordo fora firmado com o Egito sobre um comitê de especialistas palestinos que aconselharia a Autoridade a “não responder a órgãos estrangeiros”.

Embora por razões distintas, Hamas e Autoridade concordaram na não-interferência de forças externas. A Autoridade, não obstante, depende da boa vontade da comunidade internacional para manter seus fundos e estender sua própria hierarquia por meio da violência de suas forças de segurança, que colaboram com a ocupação de Israel.

A Autoridade contribuiu com Tel Aviv contra o povo palestino no recente deslocamento em massa dos refugiados no campo de Jenin.

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Outros exemplos abundam de tamanho colaboracionismo.

O Hamas, por outro lado, tentou incontáveis vezes se engajar diplomaticamente com o Ocidente, incluindo ao fazer concessões ao longo do caminho, embora em uma escala muito menor do que a Autoridade. O que o Ocidente se nega a reconhecer, no entanto, é que, enquanto houver colonialismo na Palestina, a necessidade por movimentos de resistência legítimos, conforme a lei internacional, sejam o Hamas ou quaisquer outras facções, jamais desaparecerá. 

Pelos detalhes que temos até então, o maior impacto do plano egípcio repousa em sua capitulação à comunidade internacional no ensejo de remover os palestinos do campo de decisão sobre sua própria vida. O que o Hamas chamou de “gestão não-palestina”, em referência à presença e às imposições internacionais, é precisamente o que criou as condições para o genocídio ainda em curso na Faixa de Gaza. Não é razoável pressupor que, após décadas de limpeza étnica, deslocamento à força, mortes em massa, tortura, assédio, encarceramento e abuso, os movimentos nacionais insistam nos preceitos de não-interferência?

Ademais, opor-se ao plano de Trump para a Faixa de Gaza ao apresentar outro projeto favorável ao restante da comunidade internacional não vale de nada aos palestinos. A falta de representatividade palestina, sob o esquema do Cairo, não somente serve ao regime colonial israelense como mantém abertas as portas para cumplicidade global a um novo ciclo de genocídio. De fato, vale a dúvida: a quais interesses servem os planos para a Faixa de Gaza?

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.