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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

A guerra de Israel contra a inocência: crianças palestinas em cortes militares israelenses

Ahmed Manasra, de 14 anos de idade, deixa a corte distrital de Jerusalém, em 7 de novembro de 2016

No último dia 29 de julho, Muhammad Rabi’ Elayyan, palestino de quatro anos de idade, foi convocado para ser interrogado pela polícia israelense no território ocupado de Jerusalém. O relato, originalmente divulgado pela agência de notícias oficial palestina WAFA, foi mas tarde desmentido pela polícia de Israel, naquilo que pareceu mais provavelmente uma manobra para atenuar os desastrosos impactos de relações públicas ao ocorrido.

Os israelenses não negam toda a história; contudo, argumentam que não foi o menino, Muhammad, quem foi convocado, mas seu pai. Segundo eles, foi Rabi’ Elayyan quem foi intimado para comparecer à delegacia de polícia israelense na rua Salah Eddin, em Jerusalém, para ser questionado sobre as ações de seu filho.

A criança foi acusada de atirar uma pedra contra soldados da ocupação israelense no bairro de Issawiyeh, constantemente alvejado pela violência sistemática de Israel. O bairro também é o local das trágicas demolições de residências palestinas, sob o pretexto de que lhes faltou autorização para serem construídas. Evidentemente, a grande maioria dos requerimentos palestinos para construir em Issawiyeh, ou em qualquer parte de Jerusalém, é rotineiramente indeferida; enquanto isso, colonos judeus recebem absoluta permissão e apoio para construir sobre as terras roubadas da Palestina histórica.

Dessa forma, o bairro de Issawiyeh está bastante familiarizado com o comportamento absurdo e ilegal do Exército de Israel. Em 6 de julho, por exemplo, uma mãe do bairro sitiado foi presa a fim de por pressão em seu filho adolescente, Mahmoud Ebeid, que então se entregou. A mãe de Mahmoud “foi levada pela polícia israelense como uma moeda de troca,” relatou a agência de notícias Mondoweiss, citando o Centro de Informações Wadi Hileh, com sede em Jerusalém.

As autoridades israelenses têm toda a razão de se envergonhar pelo episódio com o menino de quatro anos de idade – portanto, suas tentativas para fraudar a narrativa. O fato é, no entanto, que o correspondente da WAFA em Jerusalém conferiu pessoalmente a procuração: em nome de Muhammad, não de seu pai, Rabi’.

Embora algumas agências de notícias tenham comprado a propaganda israelense e prontamente aderido aos gritos de “fake news”, é preciso ter em mente que este episódio dificilmente se trata de um incidente solitário. Para os palestinos, essas notícias sobre detenção, espancamento e mesmo assassinato de suas crianças são parte dos aspectos mais consistentes da ocupação israelense, desde 1967.

Forças israelenses prendem uma criança palestina [Taimoor Ul Haq/Facebook]

Um dia depois da convocação de Muhammad, as autoridades israelenses decidiram interrogar também o pai de uma criança de seis anos de idade, Qais Firas Obaid, residente no mesmo bairro de Issawiyeh. O menino foi acusado de atirar uma embalagem de suco, feita de papel, contra os soldados de Israel.

“Segundo fontes locais em Issawiyeh, o Exército [de Israel] submeteu à família de Qais um mandado oficial para comparecer ao centro de interrogatórios em Jerusalém na quarta-feira [31 de julho], às oito da manhã,” relatou o Centro de Mídia Internacional para o Oriente Médio (IMEMC, da sigla em inglês). Uma fotografia registra o menino com o mandado militar em suas mãos, escrito em hebraico, diante da câmera.

As histórias de Muhammad e Qais são regra, não exceção. Segundo o Addameer, grupo de defesa dos direitos dos prisioneiros palestinos, há atualmente 250 crianças palestinas detidas nas prisões israelenses. Aproximadamente 700 crianças palestinas são levadas à corte militar de Israel a cada ano. “A acusação mais comum feita contra crianças é de atirar pedras,” relata o Addameer, “um crime cuja sentença, sob a lei militar, pode chegar até a vinte anos de prisão.”

É por isso que Israel tem toda a razão para se envergonhar. Desde o início da Segunda Intifada, em 2000, cerca de 12.000 crianças palestinas foram detidas e interrogadas pelo Exército de Israel.Além disso, não são somente as crianças e suas famílias que são agredidas pelo exército israelense, mas também aqueles que advogam em seu nome. Na semana passada, em 30 de julho, o advogado palestino Tariq Barghouth foi condenado a treze anos de prisão por uma corte militar israelense por “atirar contra ônibus e forças de segurança em diversas ocasiões.”

Por mais improvável que um advogado conceituado decida atirar contra “ônibus”, por mais inverossímil que seja esta acusação, é importante notar que Barghouth é bastante conhecido por sua defesa de crianças palestinas em tribunais israelenses. Em particular, tornou-se uma dor de cabeça para o sistema judiciário militar de Israel por sua defesa contundente de Ahmad Manasra. Então com treze anos de idade, Manasra foi julgado e condenado por uma corte militar israelense por supostamente esfaquear e ferir dois israelenses perto do assentamento judaico ilegal de Pisgat Ze’ev, nos territórios ocupados de Jerusalém, em 2015. O primo de Manasra, Hassan, de quinze anos, foi morto no local; Ahmad, ferido, foi julgado como se fosse adulto. Foi Barghouth quem desafiou e denunciou o tribunal israelense pelo interrogatório severo e por filmar secretamente a criança ferida quando ainda estava amarrada a uma cama de hospital.

Palestinos protestam em solidariedade às crianças palestinas presas e mantidas pelas forças israelenses [Mahfouz Abu Turk/Apaimages]

Em 2 de agosto de 2016, Israel aprovou uma lei que permite às autoridades “aprisionar um menor condenado por crimes graves, como assassinato, tentativa de homicídio ou homicídio, mesmo que ele ou ela tenha menos de quatorze anos de idade.” A lei foi redigida convenientemente a fim de lidar com casos como o de Ahmad Manasra, condenado a doze anos de prisão no dia 7 de novembro daquele mesmo ano, apenas três meses após a lei ser aprovada.

O caso de Manasra, os vídeos vazados dos abusos sofridos pelo jovem durante os interrogatórios israelenses e a sentença severa proferida contra ele resultaram em uma maior atenção por parte da comunidade internacional à causa das crianças palestinas submetidas ao sistema judiciário militar de Israel. “Interrogadores israelenses são vistos utilizando abusos verbais, intimidações e ameaças a fim de, aparentemente, afligir mentalmente o acusado, com o propósito de coagir sua confissão,” afirmou na época o advogado Brad Parker, representante da organização Defence for Children International – Palestine (DCIP ou Defesa Internacional da Criança – Palestina).

A convenção internacional sobre os direitos das crianças, outorgada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, da qual Israel é signatário desde 1991, “proíbe tortura, tratamento ou punição degradantes, cruéis e desumanos.” Ainda assim, Parker reitera: “Os abusos e torturas cometidos contra crianças palestinas presas pelo Exército e pela Polícia de Israel são generalizados e sistemáticos.”

De fato, são tão sistemáticos que os vídeos e relatos de prisões de crianças pequenas palestinas tornaram-se quase via de regra nas plataformas e redes sociais concernentes à causa palestina e aos direitos do povo palestino.

Crimes israelenses cometidos contra crianças palestinas devem ser confrontados efetivamente pela simples razão de que Israel, suas leis desumanas e suas injustas cortes militares devem ser impedidos de continuar impunes com tamanha brutalização contra aqueles que são, no fim do dia, somente crianças. A guerra de Israel contra a inocência deve ser detida.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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