No início de novembro, os partidos em guerra do sul do Iêmen chegaram a um acordo de compartilhamento de poder que visava não apenas aliviar as tensões entre as alianças árabes no sul do Iêmen, mas também era visto como um passo mais próximo do fim da guerra no país.
As tensões entre o governo Hadi, apoiado pela Arábia Saudita, e os separatistas do Sul apoiados pelos Emirados Árabes Unidos, lideradas pelo Conselho de Transição do Sul (STC), culminaram, em agosto, com os secessionistas do sul assumindo o controle da cidade de Aden, a capital temporária do governo internacionalmente reconhecido. Os atritos não apenas ofereciam o risco de desencadear um novo conflito, mas também ameaçavam separar dois aliados próximos do Golfo, os sauditas e os emiratis.
Embora a maioria dos conflitos armados tenha parado, a situação permanece incerta e seria ingênuo pensar que o acordo será fácil de implementar. Muito dependerá de como ele é percebido pelos dois campos opostos e se será entendido como uma solução ganha-ganha.
Como as partes do acordo não cumpriram o prazo para estabelecer um governo de poder compartilhado, muitos iemenitas se perguntam se o acordo é realista e viável.
O acordo mediado pela Arábia Saudita trata ambiciosamente de uma ampla gama de questões e visa reestruturar as relações políticas, econômicas, militares e de segurança entre o STC e o governo.
O governo recém-negociado deve ser composto por 24 ministros, com um número igual de ministérios alocados aos apoiadores do STC e Hadi.
Enquanto o acordo legitima o status do STC, que já havia sido excluído de todas as negociações de paz mediadas pela ONU, e garantiu a influência dos Emirados Árabes Unidos através do conselho, não há certeza se esse modelo realmente funcionará na prática e se o STC irá ou não cumpri-lo, incluindo a supervisão saudita do contrato.
Anne-Linda Amira Augustin, consultora política da Representação Estrangeira do STC na União Europeia, explicou ao MEMO que o conselho está pronto para encontrar uma solução não apenas com o governo, mas também para acabar com esta guerra. O STC concordou em participar de conversas com o governo imediatamente após os incidentes de agosto, mas, segundo ela, “foi o governo de Hadi que rejeitou conversar com o STC”.
Peter Salisbury, analista sênior do Crisis Group para o Iêmen, observa que o acordo busca passar ao largo da disputa política principal entre o STC e o governo. Como tal, “é amplamente visto como uma medida para evitar uma guerra civil dentro da guerra e melhorar a credibilidade do governo como participante das negociações de paz lideradas pela ONU”, disse ele ao MEMO. Ele pressupõe que o incentivo para o STC seja um ponto nas negociações, onde este poderá fazer seu apelo pela independência do sul.
Mas a agenda de independência dos sulistas pode desencadear novas tensões assim que esse assunto aparecer na mesa de negociações. De acordo com Augustin, nada mudou realmente porque “o STC deixou muito claro, desde que foi criado, que seu principal objetivo é o restabelecimento do estado no sul do Iêmen nas fronteiras anteriores a 1990 e o acordo de Riad não mudou esse objetivo.”
Se o STC tivesse desistido desse objetivo, ela está convencida de que as pessoas do sul formariam outra entidade para advogar por ele.
No entanto, a representação do sul e do norte do Iêmen permanece problemática, segundo muitos autores, pois o acordo não adotou uma abordagem inclusiva e ignora várias facções, incluindo facções do sul que não estão alinhadas com o STC. Mareike Transfeld, da Universidade Livre de Berlim, observa que muitas forças políticas no Iêmen afirmam representar grandes áreas geográficas, mas nenhuma delas foi eleita democraticamente, por isso é altamente discutível se elas representam as pessoas ou áreas que controlam.
Gerald Feierstein, vice-presidente sênior do Instituto do Oriente Médio e ex-embaixador dos EUA no Iêmen, acha que cabe aos iemenitas elaborar os termos de seus acordos políticos daqui para frente. Segundo ele, será importante que o processo seja inclusivo e dê a todos os iemenitas a sensação de que seus interesses estão sendo abordados. “A curto prazo, a questão principal era resolver a disputa entre o governo e o STC, que foi a fonte de violência no sul e ameaçou minar a ampla coalizão que os houthis enfrentam”.
Quanto a Salisbury, ele acredita que o acordo dá aos sauditas um espaço razoável para pressionar por mais inclusão durante o período de formação do governo e é provável que tentem tornar o futuro gabinete mais representativo de todas as diferentes facções alinhadas contra os houthis.
De fato, o STC começou a iniciar um diálogo sul-sul com diferentes facções sulistas, sob a presidência de Ahmad bin Buraik, chefe da Assembléia Nacional do STC, conforme acrescentou Augustin. Ela espera que as negociações de paz lideradas pela ONU sejam inclusivas e que não se repitam os erros do passado quando o STC foi excluído do processo de paz, embora as tropas do sul tenham desempenhado um papel importante na luta contra a Al Qaeda e os houthis nos últimos anos e o STC represente a maioria dos sulistas.
Outro detalhe problemático está relacionado à supervisão saudita do novo governo e de todo o acordo. Manter o destino do Iêmen nas mãos da Arábia Saudita (que é responsável pela tragédia do Iêmen) na verdade legitima a interferência saudita-Emirados Árabes Unidos nos assuntos iemenitas e limita a soberania do estado. Isso é claramente visível no caso das recentes negociações sauditas com os houthis em Omã, sem o envolvimento do governo Hadi. Assim, ao se transformarem em patrocinadores da paz entre seus representantes, os sauditas e os Emirados manterão sua influência através das facções que controlam.
No entanto, Augustin não acredita que o acordo de Riad mude significativamente a presença da Arábia Saudita ou dos Emirados no país. O principal objetivo do acordo, segundo ela, é encontrar um terreno comum entre o governo e o STC.
Na visão de Feierstein, o acordo é limitado em escopo e nem resolve todos os conflitos e divisões existentes, nem cria novos.
O acordo, portanto, não deve ser entendido como um mecanismo de resolução de conflitos a longo prazo, embora, de acordo com Salisbury, Riyadh possa usá-lo, juntamente com as negociações entre sauditas e houthis, para intermediar o início de uma solução política para acabar com a guerra, quando todos os rivalidades e divisões políticas precisarão ser tratadas. Mas, se isto se quebrar de antemão, pode muito bem dar abertura a um novo conflito.
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