O plano de resposta humanitária para 2021, destinado aos palestinos que vivem nos territórios ocupados, promete alcançar 1.8 milhão de pessoas, dentre 2.45 milhões, identificadas como vulneráveis e carentes de auxílio imediato, com 70% dos recursos alocados a Gaza.
Um comunicado de imprensa divulgado recentemente, assinado conjuntamente pelo Primeiro-Ministro da Autoridade Palestina Mohammed Shtayyeh e Lucia Elmi, coordenadora humanitária da ONU, é bastante expressivo sobre a falta de responsabilidade política diante da crise, o que efetivamente cria um nicho de negócios para a ajuda humanitária, que alimenta-se da manutenção de um verdadeiro ciclo de abusos.
Ao conseguir mencionar as ramificações da ocupação colonial israelense sem jamais citar Israel diretamente, declarou Elmi: “Enquanto soluções duradouras são procuradas, contamos com doadores e parceiros para nos ajudar a permanecer em campo, àqueles que mais precisam, para que possam viver com dignidade”.
Uma solução duradoura requer descolonização e fim da ocupação israelense sobre a Palestina, medidas negligenciadas pela ONU, de modo que os comentários de Elmi são, no mínimo, contestáveis.
Sobretudo, o plano já está em desvantagem. Até novembro, apenas 67% dos recursos necessários para o plano de resposta humanitária de 2020 foram angariados. O aumento no número de palestinos que dependem de socorro implica na urgência de maiores recursos.
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Enquanto isso, o Escritório das Nações Unidas para Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) trata o problema na Palestina ocupada com um toque de otimismo que fede ao comportamento convencional da comunidade internacional, revelado na capitulação da Autoridade Palestina ao estado sionista, desde o anúncio de um novo presidente nos Estados Unidos, com posse em janeiro próximo.
Há bases para o otimismo, alega o OCHA: “A retomada anunciada recentemente da coordenação com Israel deverá atenuar a crise financeira da Autoridade Palestina”. Além disso, a instituição internacional espera que o futuro governo de Joe Biden retome o financiamento à Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), “aos termos anteriores, como maior doador”. Trump interrompeu o envio de recursos em 2018.
Em outras palavras, as Nações Unidas estão eufóricas com mais outra rodada de violações de direitos humanos colaborativas, orquestradas e exploradas por Israel e pela Autoridade Palestina, sob o pretexto de financiar projetos humanitários. A linha tênue entre ajuda humanitária e abusos de direitos humanos já não existe mais. Washington apoia Israel e pode ainda assim retornar ao posto de maior doador da UNRWA, com recursos pífios comparados aos seus investimentos militares concedidos à violência de estado, cometida sistematicamente por Israel.
O povo palestino por acaso merece ser enganado dessa forma, em nome dos direitos humanos?
Somente 9% dos recursos do plano de resposta humanitária serão supostamente destinados à proteção dos direitos palestinos e à responsabilização dos “detentores de deveres”. Esclarece o documento: “O objetivo estratégico é melhorar a proteção ao promover e defender o respeito à lei humanitária internacional … exigindo responsabilidade e mitigando efeitos negativos das violações”. O documento jamais deixa claro a quem se destina a mensagem. Decerto, não é Israel, que conhece suficientemente bem os princípios da lei internacional para formular lacunas próprias, a fim de contornar as medidas previstas.
A diplomacia jamais deixará de ser propaganda enquanto não for capaz de abordar devidamente os problemas. Mas talvez, uma única vez, o plano de resposta humanitária poderia considerar o pressuposto de que serve de fato ao povo palestino, e não a meras estatísticas. Caso os agentes humanitários realmente pretendam servir aos palestinos sob ocupação, então devem abandonar as mentiras e falácias habituais; ao contrário, devem denunciar os ciclos de cumplicidade.
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