Docentes e discentes da Universidade de Brasília produziram uma carta onde se manifestam contrários ao entendimento para colaboração sinalizado em um encontro entre a reitora, Márcia Abrahão Moura, e o embaixador de Israel, Yossi Shelley. Na carta, afirmam que a história da UNB não é compatível com colaborações que normalizem infrações aos direitos humanos e ao Direito Internacional. Além da carta, a petição “Não a colaboração da Unb com o apartheid israelense” também está recolhendo assinaturas na internet.
No dia 30 de janeiro, a reitora publicou em seu Instagram uma foto ao lado de Shelley, ela usa uma máscara com a bandeira do estado de ocupação de Israel e ele uma com o logo da universidade. Na publicação ela afirma que o encontro com o embaixador foi produtivo e foram discutidas várias possibilidades de cooperação, “entre elas, o fortalecimento da relação com empresas israelenses” através do Parque Cientifico e Tecnológico da UNB (PCTec/UnB).
Segundo, Muna Muhammad Odeh, professora associada da Faculdade da Saúde da UnB, a carta “foi uma construção conjunta objetivando demarcar nosso espaços como palestinos e palestinas integrantes da UnB”.
“Consideramos muito grave esse fato pois a reunião foi com o embaixador e visa colaboração com empresas israelenses, ou seja, é um acordo entre uma universidade, a UnB, e um estado”, afirma Odeh. Além de Muna, a carta é assinada por professores de diversas áreas da instituição, como Said Najati Sidki, do Departamento de Matemática; Elizabeth de Andrade Hazin, do Instituto de Letras, e Alfredo Feres Neto, da Faculdade de Educação Física.
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O documento direcionado à reitora Márcia Abrahão Moura, diz:
“nós, membros da comunidade acadêmica da Universidade de Brasília, palestinas e palestinas comprometidos com a causa dos direitos humanos, acreditamos que a história e a identidade da UNB não são compatíveis com colaboração com ações de estratégia de marketing para normalizar infrações ao Direito Internacional e aos Direitos Humanos, legitimando apartheid, injustiça ambiental e limpeza étnica. Por isso que pedimos para não estreitar laços de colaboração com entidades que desenvolvem tecnologias sob aquelas condições, ou mais ainda, em prol de impetrá-las e perpetuá-las, uma vez que as atitudes de tal governo não estão em congruência com a constituição brasileira de 1988, no artigo 5.º no que se refere aos direitos e deveres individuais e coletivos, que garante a todo ser humano o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade sem qualquer tipo de descriminação.”
A carta-manifesto justifica o pedido descrevendo diversas ações israelenses que contrariam organizações internacionais, e afirmam que o que resulta disso é uma “situação insustentável em que se inflige sofrimento insuportável direcionado a um povo. É racismo ambiental a serviço de limpeza étnica paulatina”.
“Obviamente se espera que um dos pontos desta estratégia é uma articulação para “comprar” a aquiescência da comunidade internacional com ofertas de parcerias, com recortes propagandísticos maquiando a realidade, para conjugar interesses de maneira a se deixar o tempo “sacramentar” o processo e normalizá-lo. Só com muita tática diplomática cínica tais práticas poderiam perdurar e a aproximação da embaixada israelense é uma destas ações táticas.”, afirma.
Os acadêmicos também relembram a atitude diferente da universidade em relação ao Apartheid da África do Sul, lembram que o que ocorre na Palestina é semelhante ao regime sul africano e apontam a incongruência entre rechaçar o que aconteceu na África do Sul, mas colaborar com o Apartheid israelense contra o povo palestino.
“Em agosto de 1991 a universidade de Brasília recebeu a visita de Nelson Mandela, líder símbolo da luta sul-africana contra o racismo institucional e por igualdade racial. Durante seu discurso, Mandela defendeu a função da universidade de “perseguir o desenvolvimento, os valores, as habilidades e as atitudes na luta pela democracia’’. E um dos companheiros de luta e vida mais próximos de Mandela, o Arcebispo anglicano sul africano Desmond Tutu aponta contundentemente que o que ocorre com os palestinos é do mesmo grau do apartheid contra o qual lutara na África do Sul13. Não há justificativas então para um rechaço ao sistema de Apartheid na África do Sul combinado com uma colaboração contra uma política deliberada, estratégica e sistemática de opressão sobre os palestinos.”
Até agora, a reitoria não se manifestou em relação a carta, apenas confirmou o seu recebimento.