Despoluição do Rio Pinheiros, crise hídrica, uso e reuso de água para agricultura familiar estiveram na pauta paulista durante reunião da Comissão de Relações Exteriores da Assembleia Legislativa (Alesp), no último dia 24 de junho, com o cônsul de Israel, Alon Lavi, a qual contou com a participação do secretário de Estado das Relações Internacionais, Julio Serson. Em debate, as tecnologias sionistas nessa área. Tecnologias que São Paulo – e Brasil como um todo – não precisam.
Soluções são apresentadas há décadas pelos cientistas, pesquisadores e especialistas de instituições de excelência no Brasil. Em desenvolvimento na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, tecnologia de “nanobolhas” – sem uso de produtos químicos nem geração de resíduos – para a melhoria da qualidade da água no Rio Pinheiros.
Quanto à crise hídrica, em vez de o País aproveitar seu potencial e investir em energias eólica e solar, o Congresso Nacional aprovou em junho último a Medida Provisória 1.031/2021, do Executivo, relativa à privatização da Eletrobras, estratégica inclusive para a diversificação da matriz. A MP, cuja tramitação no Legislativo se deu sob vergonhosa negociata, agora aguarda sanção presidencial.
Enquanto o desmonte no Brasil segue, a farsa sionista é aplaudida. “Israel é um líder mundial nesse quesito e já conseguimos evitar a situação da escassez de água no país. O tratamento de água e reuso para a agricultura é algo que podemos ajudar muito no Estado de São Paulo”, disse Lavi durante a reunião. A parceira foi celebrada por deputados de distintos partidos e por Serson, o qual frisou: “Israel é um parceiro prioritário do Estado de São Paulo e também do Brasil.” A comissão ficou de sugerir uma parceria nessa área de agricultura familiar em alguma região paulista.
LEIA: Contra o apartheid da água nas favelas do Rio de Janeiro, a solidariedade palestina
O que está em jogo, contudo, não é a melhoria da qualidade de vida dos paulistas e brasileiros. O objetivo sionista é vender suas tecnologias que sustentam a ocupação na Palestina, as quais são apresentadas sob falsa propaganda típica da mentalidade colonial de que ali estão as soluções para problemas locais. Uma forma de “lavar” a imagem de Israel, moldada sob o sangue palestino na contínua Nakba (catástrofe com a criação desse Estado racista em 15 de maio de 1948, mediante limpeza étnica palestina planejada) – o que está cada vez mais difícil de esconder. As águas paulistas serviriam para encobrir seus crimes contra a humanidade.
Apartheid na Palestina
Em meio à pandemia de Covid-19, evidenciou-se o que os palestinos vivem e contam há tempos, mas o mundo sempre insistiu em ignorar: Israel lhes impõe um regime institucionalizado de apartheid, inclusive hídrico e sanitário. A Human Rights Watch (HRW) apresentou em abril último extenso relatório que comprova a segregação.
No documento, detalha o apartheid da água na Palestina ocupada, em violação ao direito internacional. “Israel extrai diretamente cerca de 90% do Aquífero da Montanha [na Cisjordânia] anualmente, deixando aos palestinos apenas os restantes 10%. […] Além disso, as autoridades israelenses privaram quase totalmente os palestinos de acesso à água do Rio Jordão, o único grande recurso hídrico superficial na Cisjordânia, desviando seu fluxo. […]”
LEIA: Do Brasil à Palestina, direitos humanos para quem?
“As políticas israelenses na Área C [definida sob controle militar exclusivamente israelense nos desastrosos acordos de Oslo em 1993] restringem ainda mais o acesso dos palestinos à água.” Segundo a HRW, o muro do apartheid, por exemplo, “separa os palestinos de mais de 20 poços […]. As autoridades israelenses também negam autorizações para os palestinos construírem dutos de água […]”. E ainda de acordo com o relatório, entre 2009 e julho de 2019, “demoliram ou apreenderam 547 estruturas que forneciam água e serviços de saneamento relacionados, incluindo cisternas, canos de água […]”.
O documento conclui: “As políticas hídricas discriminatórias de Israel na Cisjordânia permitem que os colonos desfrutem de água abundante, enquanto algumas comunidades palestinas não têm água suficiente para suprir suas necessidades básicas.” A produção agrícola local, por conta da ocupação, enfrenta, portanto, escassez que desafia a subsistência.
É o que revela informe publicado em março de 2020 pela Al Haq, organização palestina de direitos humanos, que acrescenta: “Diante disso, em 2016, os palestinos na Cisjordânia ocupada consumiam em média apenas 73 litros de água por dia, bem abaixo dos 100 litros recomendados pela OMS [Organização Mundial da Saúde], enquanto os colonos israelenses consumiam aproximadamente 369 litros por dia, mais de três vezes a média recomendada.” Segundo a organização, hoje, esses residentes ilegais consomem três a oito vezes mais água do que toda a população palestina da Cisjordânia.
A empresa israelense responsável pelo apartheid da água é a Mekorot, que tem buscado acordos de cooperação técnica com companhias estaduais brasileiras, sempre sob a falsa propaganda de que teria feito “florescer o deserto” – contra o que o movimento BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções) já obteve vitórias importantes em São Paulo e na Bahia. O informe da Al Haq desmonta essa mentira usada para a colonização na Palestina. O problema é a usurpação sionista das fontes de recursos naturais e suas ações criminosas.
LEIA: Indígenas no Brasil e palestinos: lutas que se encontram
A contínua Nakba é também ambiental. Em relatório intitulado “Environmental Injustice in Ocuppied Palestinian Territory – Problems and Prospects” (Injustiça ambiental nos territórios palestinos ocupados), publicado em 2015, a Al Haq aponta uma série de exemplos nessa direção, por exemplo, a instalação de zonas industriais israelenses altamente poluentes na região de Tulkarm, na Cisjordânia, que despejam seus contaminantes sobre os palestinos e causam sérios danos à saúde.
Outro caso denunciado pela Al Haq é de instalação por Israel de “lixões” sobre aquíferos que abastecem famílias palestinas, por exemplo em Qalqylia, também na Cisjordânia – com alta incidência de câncer entre essa população. Também em Abu Dis, Jerusalém, os habitantes – que são refugiados internos, oriundos de áreas em que foram expulsos – são obrigados a conviver com depósito de lixo tóxico ali colocado por Israel.
Na Faixa de Gaza, onde vivem 2 milhões de palestinos sob cerco israelense desumano há 14 anos, como descreve a organização no informe publicado em 2020, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) revelou que “a partir de 2019, apenas uma a cada dez famílias tinha acesso à água limpa e segura. Somente 5% do abastecimento na Faixa de Gaza é fornecido por Israel, a potência ocupante, enquanto o restante vem do aquífero costeiro, que está amplamente contaminado, ou de poços privados, inacessíveis para a maioria dos palestinos.”
Essas e muitas outras denúncias demonstram que, diferentemente do que propagandeou na Comissão de Relações Exteriores da Alesp, o Estado sionista não é exemplo para ninguém. Explicitam ainda aos governos e parlamentos, como o de São Paulo, que fazer parcerias com o apartheid vai contra até mesmo o direito internacional. Podem, portanto, vir a ser responsabilizados pela cumplicidade com crimes contra a humanidade. Urge aos oprimidos e explorados pressionarem essa comissão e o Executivo paulista a que não celebrem tal aliança. Pelo contrário, caminhem na direção da ruptura de todo acordo de cooperação com o Estado de Israel e do embargo militar.
LEIA: Embargo militar a Israel pelo direito à vida
Somado a isso e à luta por investimento público em ciência, tecnologia e pesquisa em São Paulo e no Brasil como um todo, é imprescindível ampliar a mobilização pelo fora Bolsonaro, genocida e corrupto que vem transformando, cada vez mais, o País numa colônia. Sob as bênçãos do seu aliado sionista. O próximo passo são as ruas brasileiras no dia 3 de julho. A bandeira palestina certamente estará presente, ao lado da justiça e humanidade.
As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.