Ativistas tunisianos de direitos humanos voltaram a pressionar o presidente Kais Saied a abandonar sua “retórica de difamação” contra críticos e opositores, ao apontar para a escalada de tensões e intolerância no país norte-africano.
Entre os apelos, está o fim das ameaças contra funcionários públicos e um cronograma para encerrar as “medidas excepcionais” promulgadas pelo presidente, em julho último.
O partido Corrente Democrática também exortou Saied a abandonar esforços para “distorcer a imagem” de seu secretário-geral, Ghazi Chaouachi.
Cerca de 33 personalidades de direitos humanos, incluindo ex-ministros e parlamentares, assinaram uma nota de solidariedade ao ex-Ministro da Agricultura Samir Bettaieb.
Bettaieb foi detido recentemente sob acusações relacionadas a um acordo público-privado, assinado em 2014, antes mesmo de assumir a pasta.
Os signatários advertiram que o encarceramento de Bettaieb “ocorre em uma atmosfera geral de incitação e ódio, sob a qual foi pessoalmente exposto a uma campanha de difamação, falácias e insultos, nas plataformas de redes sociais”.
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“Condenamos veementemente a invasão de sua casa, o roubo de seus pertences e a intimidação contra sua esposa e família — práticas criminosas que pensamos ter superado”, reiterou o comunicado, compartilhado na segunda-feira (1°).
Além disso, os ativistas exortaram Saied a “abdicar permanentemente de difamações, violência e escárnio contra seus oponentes, o que apenas agrava tensões, divisões e ódio”.
Em apelo para que juízes mantenham sua independência política, enfatizou o comunicado: “Também pedimos [ao presidente] para deixar de aparelhar instituições do estado, ao pressioná-las e ameaçar seus incumbentes, sobretudo no judiciário”.
Autoridades tunisianas prenderam oito ex-oficiais, incluindo Bettaieb, sob “suspeita de crimes contra as provisões regulatórias e legislativas, que garantem liberdade de participação e oportunidades iguais nos acordos públicos”
Segundo a Corte de Primeira Instância da capital, os detidos foram acusados de corrupção e lavagem de dinheiro, por crimes vinculados a um pedido de equipamentos de mídia pelo Ministério da Agricultura, estimados em aproximadamente US$280 mil.
Bettaieb e três servidores do ministério foram condenados à prisão.
O presidente conservador detém poder quase absoluto desde 25 de julho, quando destituiu o primeiro-ministro Hichem Mechichi, suspendeu o parlamento e assumiu autoridade executiva no país, sob pretexto de “emergência nacional”.
Em 29 de setembro, mais de dois meses após sua investida, Saied enfim indicou Najla Bouden como nova premiê, para compor um governo, conforme prometido.
A maioria dos partidos políticos tunisianos, no entanto, descreveu as medidas como golpe contra a constituição e contra as conquistas democráticas da revolução de 2011, que resultou na queda do longevo ditador Zine el-Abidine Ben Ali.
Críticos observam que as ações de Saied concederam novos poderes à presidência da república, às custas do parlamento e do gabinete de governo. Analistas advertem que Saied busca converter o país a um sistema plenamente presidencial.
Saied — jurista conservador, sem partido, cujo mandato de cinco anos teve início em 2019 — nega quaisquer acusações de golpe, ao insistir que suas ações são consagradas pela constituição para proteger o estado de um “iminente perigo”.