O Conselho de Segurança realizou uma sessão nesta quarta-feira (23) sobre o tema Mulheres, Paz e Segurança. O foco é a prestação de contas como meio de prevenção pelo fim dos ciclos de violência sexual em conflito. O mundo fechou o ano passado com 800 notificações a mais que em 2020.
A sessão analisou o relatório da ONU que lista a República Democrática do Congo no topo de crimes deste tipo em 2021. Foram 1.016 casos registrados do total de 3.293 incidentes em nível global. E 97% dessas vítimas são mulheres e meninas.
Ambiente
Os participantes debateram a necessidade de se promover um ambiente protetor que “iniba a violência sexual em primeira instância e permita que relatos e respostas sejam processados de forma segura”.
A representante especial do secretário-geral sobre Violência Sexual em Conflitos, Pramila Patten, enumerou formas de desigualdade baseadas em questões de etnia, filiação política, idade, deficiência, orientação sexual identidade de gênero, rendimento e situação migratória que aumentam o risco das vítimas.
Patten conta que se juntam a estes fatores “os históricos desequilíbrios estruturais e sistêmicos de oportunidades”. Para ela, a real escala desses incidentes é desconhecida com vítimas silenciadas por trauma, dor, desespero aliados ao estigma e à insegurança.
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Ela destacou a relação entre o silêncio individual e o silêncio oficial, que vem das autoridades: “não se pode esperar que os sobreviventes denunciem o que o próprio Estado nega”.
Vergonha
Patten lembra que quando os autores ficam impunes, os sobreviventes andam com medo, “carregando o fardo do ostracismo e da vergonha”. Ao pedir que se melhore o ambiente de proteção, ela disse que a medida permita dar uma resposta segura e eficiente.
Ela ressaltou que vítimas de países como Ucrânia, Afeganistão, Mianmar ou Etiópia, na região de Tigray, requerem mais do que resoluções sobre mulher paz e segurança.
Sobre a pandemia, o informe destaca que a crise “silenciou as armas, mas no período foi observado um “aumento da militarização, incluindo uma epidemia de golpes, que atrasou os direitos das mulheres.”
Jornalistas
O relatório menciona novas crises se multiplicaram, num cenário de guerras entrincheiradas que avançam, exacerbando o desafio de contrair ou em alguns casos “encerrar o espaço cívico, manifestado em represálias crescentes contra mulheres defensoras de direitos humanos, ativistas e jornalistas.”
Para Patten, a falha em reconhecer e investigar atrocidades do passado é o sinal mais seguro de que as violações seguirão.
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Em nível global, o relatório aponta que a ilegalidade e a impunidade equivalem a uma espécie de “licença para estuprar”. A recomendação é que seja reforçada a ação penal.
Pramila Patten destacou que enquanto a impunidade normaliza a violência, a justiça reforça as normas globais.
Nadia Murad
A ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, Nadia Murad, ativista e sobrevivente das ações do Estado Islâmico do Iraque e do Levante, Isil ou Daesh, na comunidade yazidi. Ela disse que as vítimas esperam que o Conselho aja com a mesma coragem demonstrada por elas “que não requerem piedade, mas justiça”.
Para Nadia Murad, a prestação de contas é essencial para a prevenção, e tem que incluir serviços de apoio a sobreviventes e a promoção da equidade de gênero em nível global.
A ativista também mencionou a situação da Ucrânia dizendo que “sempre que irrompe um conflito armado em qualquer lugar do mundo, seguem-se o estupro e a brutalidade”.
Para Murad, a violência sexual não é um efeito colateral do conflito, mas “tática de guerra tão antiga quanto o tempo” e deve estar clara para todos.”. O grupo capturou mais de 6 mil mulheres e crianças yazidis, vendeu e estuprou algumas delas e até 2,8 mil vítimas ainda vivem em cativeiro e escravidão sexual nas mãos do grupo.
Publicado originalmente em ONU News