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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

A bandeira palestina e o fim do mito da democracia israelense

Bolsonaristas em frente ao Palácio do Planalto, na véspera da posse de Jair Bolsonaro como Presidente da República, em 31 de dezembro de 2018 [Lucas Martin/Jornalistas Livres]

Na coluna da semana passada, comentei sobre a presença da bandeira de Israel nos atos antidemocráticos do último dia 8 de janeiro, e o que isso representa em termos simbólicos para o bolsonarismo, bem como para a extrema-direita ao redor do mundo. Como comentei, as bandeiras são utilizadas na contemporaneidade como elementos que traduzem ideias e ideais políticos, em diferentes espaços e contextos. Ao mesmo tempo em que bandeiras são hasteadas e empunhadas no Brasil – representando valores opostos à civilidade e tolerância –, em Jerusalém, são impedidas de serem hasteadas bandeiras de liberdade.

Após 18 meses na oposição, Benjamin Netanyahu retornou ao poder em Israel pela sexta vez, aliado a uma tenebrosa coalizão que possui figuras como Itamar Ben-Gvir, atual ministro da Segurança Pública, do Poder Judeu – que pode ser descrito como o partido fascista de Israel – e Bezalel Smotrich, do partido Sionismo Religioso – partido conservador ortodoxo que defende a aniquilação dos palestinos em toda a Palestina histórica. Essas duas figuras são representações do auge do estado etnocrata israelense. Nesse novo contexto, em que a coalizão liderada pelo Likud detém 64 cadeiras das 120 no parlamento, as forças mais radicais e fascistas passaram a operar no centro da arena política israelense para destruir a Palestina e o povo palestino.

Ben-Gvir, como ministro, ordenou a proibição das bandeiras da Palestina nos espaços públicos, como uma nova fase da escalada do governo de Netanyahu contra a população palestina no país. Recentemente, Ben-Gvir voltou a invadir a Mesquita de Al-Aqsa, um dos locais mais sagrados do Islã, cuja visita só é permitida a praticantes da religião. Suas ações foram tão estapafúrdias que geraram uma reação imediata de ministérios das Relações Exteriores de vários países, incluindo Brasil, que emitiram diversas notas de repúdio sobre a incursão de um político extremista na mesquita, ao pôr em xeque o status quo histórico e legal de Jerusalém.

As medidas tomadas por Ben-Gvir são parte de um longo processo de agressões contra os palestinos, que vão desde a prática de genocídio e outros crimes contra a humanidade até a proibição de símbolos nacionais. O que se observa na política israelense é o esgotamento retórico daquilo que eles promoveram no mundo como a “única democracia do Oriente Médio”. Essa falácia está cada vez mais enfraquecida pela sanha de lideranças fascistas em querer extirpar na face da terra aquilo que não são eles – no caso, portanto, os árabes e sobretudo os palestinos.

O pressuposto do regime democrático é o respeito às minorias políticas e o seu direito de existência – tudo o que não ocorre em Israel. A democracia não pode coexistir com apartheid, não importa sua justificativa. Pois, uma vez que se permite algo assim, a alteridade é desumanizada e, logo, descartável. O verniz que Israel transmitia de “democracia” se desfaz há algum tempo, dado que é inaceitável denominar como democracia um estado que institucionaliza um regime de apartheid!

A questão é que isso não é novidade na cena política israelense. Itamar Ben-Gvir, por exemplo, esteve entre aqueles que comemoraram a morte de Yitzhak Rabin, junto de radicais de extrema-direita que detestavam a ideia de firmar eventuais “acordos de paz” com os palestinos – a saber, os Acordos de Oslo. Depois de 27 anos, após ter seu discurso repetido milhares de vezes, aquilo que era extremista demais, que não deveria ser levado a sério, passou a ganhar centralidade na política israelense, com a manutenção do apartheid e seu aprofundamento. Ano passado, Itamar Ben-Gvir saiu às ruas do bairro palestino de Sheikh Jarrah, em Jerusalém ocupada, com uma arma carregada nas mãos. Nessa situação afirmou “Nós somos senhores daqui, lembrem-se disso, somos nós que mandamos”, “Se eles [os palestinos] jogarem pedras, atirem neles!”.

Desta maneira, proibir da bandeira palestina em público e equipará-la ao que consideram “terrorismo” é reflexo de esforços para resgatar (à força) certa reputação internacional – hoje, em meio a ameaças ao status quo israelense nos fóruns multilaterais e junto das demais nações da comunidade internacional. Além disso, é uma tentativa de silenciar a voz da esperança, daqueles que acreditam de fato na paz e na justiça. Hoje, a bandeira da Palestina traz medo aos próceres do estado israelense que temem por suas condenações no contexto do Tribunal Penal Internacional (TPI), por crimes de guerra e lesa-humanidade, sob esforços do governo palestino, mediante atuação de seu chanceler, Riad Al-Maliki, em obter da Corte Internacional de Justiça (CIJ) uma posição legal sobre a ocupação e os assentamentos sionistas na Cisjordânia.

Em 2022, apesar das dificuldades em materializar uma luta de um povo em diáspora e de reuni-los sob uma bandeira e sob o mesmo hino, devido à distância e às dificuldades de articular a resistência em certos territórios – muitas vezes hostis à presença palestina –, a luta progrediu. Conseguimos derrotar uma faceta do sionismo no Brasil que impedia o bom diálogo com a Palestina, representada pelo ex-presidente extremista Jair Bolsonaro. Além disso, a solidariedade à causa se fez presente em um dos maiores eventos esportivos, a Copa do Mundo do Catar, que teve como um dos protagonistas a seleção do Marrocos – a surpresa da Copa – e que trouxe consigo, como coadjuvante, mas sempre presente em seus corações e nas chuteiras, a Palestina histórica.

Torcedores seguram uma bandeira da Palestina com a inscrição Palestina Livre durante a partida do Grupo D da Copa do Mundo da FIFA Qatar 2022 entre Tunísia e Austrália no Al Janoub Stadium em Al Wakrah, Qatar. [Foto de James Williamson – AMA/Getty Images]

A luta continua e estaremos cada vez mais fortes, pois o que nos move é uma causa nobre: a terra dos homens é, realmente, de todos os homens? Por isso…

Não me Canso de Falar

Não me canso de falar sobre a diferença tênue

entre as mulheres e as árvores,

sobre a magia da terra, sobre um país cujo carimbo

não encontrei em nenhum passaporte.

Pergunto: Senhoras e senhores de bom coração,

a terra dos homens é, como vós afirmais, de todos os homens?

Onde está então o meu casebre? Onde estou eu?

A assembléia aplaudiu-me durante três minutos,

três minutos de liberdade e de reconhecimento…

A assembleia acaba de aprovar

o nosso direito ao regresso,

como o de todas as galinhas e todos os cavalos,

a um sonho de pedra.

Aperto-lhes a mão, um a um, depois faço uma saudação,

inclinando-me…

e continuo a viagem para outro país,

onde falarei sobre a diferença

entre miragens e chuva.

E perguntarei:

Senhoras e senhores de bom coração,

a terra dos homens

é de todos os homens?

Mahmoud Darwish (1941-2008)

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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