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Islã, ficção científica e vida extraterrestre: A cultura da astrobiologia no mundo islâmico

Autor do livro(s) :Jorg Matthias Determann
Data de publicação :Maio de 2023
Editora :I.B. Tauris
Número de páginas do Livro :284 páginas
ISBN-13 :978-0755650361

O Islã e a ficção científica podem não parecer à primeira vista um casamento convencional. No entanto, o mundo islâmico alimentou uma narrativa fascinante no gênero. Em seu livro – com o título Islam, science fiction, and extraterrestrial life: The culture of astrobiology in the Muslim world; ou Islã, ficção científica e vida extraterrestre: A cultura da astrobiologia no mundo islâmico (2023) –, Jorg Matthias Determann, autor e pesquisador radicado no Catar, busca explorar a “imaginação científica” como é expressa nas mais diversas mídias, incluindo literatura e cinema. Seu livro abrange uma série de temas relevantes, como espaço sideral, vida extraterrestre, viagem no tempo e ufologia.

Parece apropriado que o capítulo de abertura – Lord of the Worlds, ou Senhor dos Mundos – é uma referência à primeira sura do Alcorão, al-Fatihah, cujo texto, segundo a interpretação literária do autor, concede apoio ao conceito tão popular na ficção científica de pluralidade de mundos, por meio da expressão Rabb al-Alamin – Senhor dos Mundos. Outros versos, de acordo com Determann, “são vagos o bastante para permitir visões bastante diversas sobre o universo”. No que se refere a formas de vida extraterrenas, comenta o autor: “O encontro entre humanos e gênios é parte da literatura islâmica desde o Alcorão”.

Ao longo do livro, Determann indaga e contesta o pressuposto de que vertentes autoritárias da religião tenham sufocado a ficção científica em particular e a criatividade de modo geral, entre os muçulmanos. O autor chega até mesmo a desafiar a noção de que o secularismo é um melhor conduíte à “imaginação científica” do que o Islã.

“A repressão pode ter ajudado a ficção científica mais do que a prejudicado”, argumenta o livro, ao reiterar que a censura costuma encorajar escritores a diluir suas críticas ao governo com metáforas “de tempos futuros e planetas remotos”. O sentimento de decepção da era pós-colonial e da Primavera Árabe também deram vazão a romances distópicos, “como uma forma de resistência literária”.

Ainda assim, o leitor pode ser surpreendido ao saber que o regime sírio de Bashar al-Assad ativamente concedeu apoio à ficção científica, mesmo no decorrer dos dez anos de guerra civil, incluindo a publicação de uma revista literária com enfoque no gênero. Naturalmente, Determann questiona se essa iniciativa serviu de “crítica autorizada ou comissionada” pelo governo. Enquanto isso, Estados prósperos – porém autoritários – no Golfo abraçaram uma espécie de “futurismo paternalista”, incluindo a construção da cidade-inteligente de Neom, na Arábia Saudita, e as ambições dos Emirados Árabes Unidos em estabelecer uma colônia em Marte dentro de cem anos.

Um dos aspectos mais interessantes e intrigantes do livro é sua abordagem ponderada sobre a matéria. Determann reconhece a diversidade de opiniões dentro do mundo islâmico, que se estende desde o Oriente Médio e Norte da África aos confins do Sul e Sudeste Asiático, incluindo pontos de vista conservadores e progressistas. Isso permite ao leitor desfrutar de uma compreensão abrangente sobre o complexo relacionamento entre fé, ficção científica e astrobiologia – “o estudo da vida no universo”.

Além de examinar escritores e cineastas influentes e desconhecidos do gênero, Determann explica como as narrativas de ficção científica – tanto no mundo islâmico quanto no planeta em geral – conferiram forma ao imaginário da ciência. Periódicos e obras literárias ocidentais deixaram um impacto considerável e “empréstimos de Hollywood são bastante evidentes”, com chavões e pastiches reproduzidos na grande maioria dos países islâmicos.

Ainda assim, reitera a obra: “Produções ocidentais tomaram como fonte paisagens e culturas do Oriente Médio” – incluindo Duna e Guerra nas Estrelas, filmados na Tunísia. Até mesmo a casa original de Luke Skywalker, no planeta Tatooine, toma como cenário o sul da Tunísia. A proliferação recíproca de ideias assume uma dimensão mais intrincada com a contribuição crescente de futuristas muçulmanos na diáspora.

A parte sobre ufologia islâmica é particularmente fascinante, com avistamentos de objetos voadores não-identificados (OVNIs) tão comuns como em qualquer outro lugar. Conforme o autor, muçulmanos “também colaboraram com a produção de conhecimento global sobre os discos voadores”, por meio de novas perspectivas sobre o fenômeno, incluindo a teoria de que os alienígenas poderiam muito bem ser os gênios da mitologia ancestral. Isso alimentou de fato a imaginação ocidental e a percepção geral da cultura popular. Para além da corrente predominante da comunidade islâmica, Determann traz à luz também “as religiões islâmicas dos OVNIs” – a mais proeminente delas, o grupo conhecido Nation of Islam (NOI), radicado nos Estados Unidos, que bebe de fontes do afrofuturismo.

Como outros críticos disseram, o livro às vezes pode exagerar nos detalhes e sobrecarregar, quem sabe, o leitor casual e desavisado com um assunto de nicho. Contudo, Islam, science fiction, and extraterrestrial life encoraja seu público a expandir horizontes e contrapor ideias pré-concebidas sobre a relação entre religião e ficção científica. Ao mergulhar nesse aspecto pouco conhecido do chamado “mundo islâmico”, podemos apreciar a diversidade de cultura e expressões criativas de outros terráqueos – quem sabe, do infinito e além.

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