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Imprensa brasileira faz lavagem cerebral sobre eleições pelo mundo

Mulher vota enquanto membros do serviço se registram para votar durante a eleição presidencial da Rússia em Moscou, em 15 de março de 2024.[ Natalia Kalosnikova//AFP via Getty Images]
Mulher vota enquanto membros do serviço se registram para votar durante a eleição presidencial da Rússia em Moscou, em 15 de março de 2024.[ Natalia Kalosnikova//AFP via Getty Images]

Uma reportagem recente da TV Globo apontou que 2024 é o ano com mais eleições pelo mundo nos últimos tempos. Em alguns países, elas serão uma celebração e um termômetro para  medir a força da democracia, enquanto em outros elas não passam de uma farsa para consolidar regimes ditatoriais.

Não é difícil adivinhar quem é o grande exemplo de eleição democrática e quem são os maiores exemplos de farsa ditatorial, segundo a Globo. A reportagem mostrava imagens de Joe Biden e de Donald Trump no momento em que citava as eleições “democráticas” e imagens de Vladimir Putin e Nicolás Maduro quando falava das eleições de fachada.

A cobertura nos principais veículos que formam o monopólio de comunicação no Brasil é uníssona: as eleições nos EUA são democráticas e as eleições nos países cujos governos são “adversários” dos EUA são fraudulentas.

Foi assim que se tratou as eleições presidenciais na Rússia, realizadas em março. Embora Putin tenha um apoio real enorme dentro da sociedade, que gira em torno dos 87% de votos que recebeu, indicando que as urnas foram fiéis à correlação de forças políticas no país, os veículos de imprensa brasileiros trataram de acusar Putin de manipular as eleições.

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Não houve nenhuma manchete positiva nos três grandes jornais (Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo e O Globo) durante o mês de março. Em compensação, as negativas representaram cerca do dobro das manchetes que poderiam ser consideradas neutras – com muito esforço e bondade do analista em relação a esses jornais.

O Globo falou que era uma “eleição de cartas marcadas”, por exemplo. Alexei Navalny, um blogueiro treinado e financiado publicamente pela CIA, desconhecido pela esmagadora maioria dos russos, foi retratado como mártir e símbolo da violência do regime contra seus opositores, com grande destaque no noticiário após a sua morte.

Nada foi dito sobre os 160 mil ataques cibernéticos contra o sistema eleitoral russo, a maioria dos quais originados dos Estados Unidos e do Reino Unido, conforme denunciaram as autoridades eleitorais russas. Por outro lado, há anos existe uma forte campanha na imprensa acusando a Rússia de interferir em eleições pelo mundo, principalmente nos EUA.

As eleições na Rússia não foram tão atacadas e manipuladas pelo noticiário brasileiro, contudo, quanto as venezuelanas. Ainda a ocorrer no meio do ano, o pleito presidencial no país vizinho tem sofrido uma gigantesca campanha de desestabilização e desprestígio pelos grandes jornais do Brasil.

Folha e Estadão copiam um ao outro em manchetes de papagaio como as que chamam o governo venezuelano de “ditadura de Maduro”. Unem-se ao Globo para espalham uma campanha de intensa desinformação, retratando a oposição (que desde a ascensão do chavismo já tentou inúmeros golpes de Estado) como democrática e vítima da ditadura, embora a Venezuela tenha tido quase 30 eleições e referendos nos governos Hugo Chávez e Nicolás Maduro.

Uma  notícia que se espalhou por todos os tentáculos do monopólio propagandístico brasileiro – que, por sua vez, é uma extensão do aparato de propaganda de Washington – foi a da foto de Maduro repetida várias vezes na cédula eleitoral. Os jornais utilizaram o fato para indicar que Maduro manipula o voto dos eleitores para que votem nele e não em seus opositores. A realidade, contudo, é que na cédula aparecem os candidatos apoiados por cada partido, com o nome do partido junto com o seu candidato. Como a candidatura de Maduro é apoiada por 13 partidos, sua foto aparece 13 vezes, e os outros candidatos também aparecem tantas vezes quantos partidos os apoiam.

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Todas as notícias sobre o governo e a candidatura Maduro são extremamente negativas e mesmo as que um observador benevolente possa considerar neutras, na verdade não passam de propagação de estereótipos negativos, levando em consideração que a campanha contra a Venezuela existe há mais de dez anos com muita força e a maioria dos leitores e telespectadores já se acostumou a pensar que o país é uma ditadura onde o povo é oprimido pelo regime.

Só se fala da suposta perseguição à oposição, da suposta falta de transparência, embora haja 13 candidatos e o Centro Carter (do ex-presidente norte-americano Jimmy Carter) considere as eleições venezuelanas as mais transparentes do mundo, com verificação dupla: eletrônica e impressa. Sobre isso, o monopólio da comunicação se cala. Precisa passar a impressão ao público que na Venezuela não existe um pingo de democracia e só a derrubada do chavismo fará com que ela apareça.

Esse é exatamente o mesmo discurso do governo dos EUA. Afinal de contas, a imprensa brasileira não passa de um porta-voz da opinião do imperialismo americano. E, como tal, além de mentir sobre as eleições em países cujos governos não se dobram à sanha opressora dos EUA, essa mesma imprensa louva as eleições americanas.

Nem na TV, nem nos jornais, nem nas rádios, nem nos grandes websites há qualquer mínimo questionamento sobre a lisura do processo eleitoral americano. Não importa que o país seja uma ditadura bipartidária onde democratas e republicanos não passam de dois lados da mesma moeda. Não importa que a vontade dos eleitores valha menos do que o resultado dos colégios eleitorais (afinal, ao contrário das “ditaduras” russa e venezuelana, as eleições “democráticas” nos EUA são indiretas).

Não importa que o dinheiro dos grandes banqueiros, industriais, comerciantes e latifundiários seja o maior impulsionador das campanhas, e que esses só apoiam os candidatos que lhes jurarem fidelidade e lhes prometerem as maiores benesses se for eleito. De fato, quem queira se eleger precisa se ajoelhar para esses grandes capitalistas, que na verdade controlam com mão de ferro todo o sistema político norte-americano. A imprensa trata esse negócio evidentemente corrupto como algo natural e inerente à democracia. Claro, porque ela própria faz parte disso: se nem mesmo a americana cita os outros candidatos, é óbvio que suas sucursais brasileiras não irão noticiar as atividades dos pobres coitados que concorrem como parte (aqui sim!) dessa eleição de cartas marcadas.

Biden e Trump são idosos que já não conseguem articular bem as palavras e o atual presidente mal consegue controlar sua locomoção. Praticamente todos os dias ele comete alguma gafe vergonhosa que viraliza nas redes sociais, mas a imprensa finge que isso não acontece. A Folha de S.Paulo, contudo, se regozija em publicar uma matéria sensacionalista com o título “Maduro tenta mandar mensagem em inglês a Biden e vira alvo de piadas”, demonstrando seu capachismo e preconceito, como se Biden soubesse falar espanhol – aliás, os americanos são completamente ignorantes de outros idiomas e estão pouco se lixando para aprendê-los, mas a Folha acha que um presidente hispânico tem a obrigação de falar inglês.

Maduro e Putin são os responsáveis por criar “obstáculos para eleitores votarem”, como disse o Estadão, mas é nos Estados Unidos onde os cidadãos são, na prática, desincentivados a votar, pois o pleito ocorre em dia de trabalho normal e o trabalhador sequer tem tempo de acorrer às urnas – além de desconhecer os candidatos.

Os partidos democrata e republicano são apresentados como rivais, mas essa mesma imprensa não consegue esconder que nos assuntos que realmente importam eles sempre estão de mãos dadas e nenhum se opõe ao regime (esse sim, um regime no sentido de ser uma ditadura) americano, pois os dois são os representantes desse regime.

Na Venezuela ou na Rússia os opositores pagos pelos EUA são falsamente retratados como combatentes da liberdade para retirar a elite corrupta do poder. Nos EUA, que é tão ditatorial que nem sequer existe essa oposição (de forma organizada), a oposição popular desorganizada não é considerada oposição pela imprensa. É como se o povo fosse a favor da “democracia” americana, e os que não o são merecem o desprezo como antidemocráticos e marginais.

Não se enganem: o que estamos lendo e ouvindo dos apresentadores, repórteres e comentaristas não é a verdade e nem mesmo uma opinião honesta. É pura propaganda muito bem articulada em uma rede monopolística para manter os súditos do império ignorantes da opressão que sofremos desse mesmo império. A imprensa capitalista não passa de um instrumento da burguesia para enganar o povo, e num país como o Brasil, praticamente colonizado pelos EUA, essa imprensa é porta-voz da metrópole contra os nossos interesses.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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