Setenta e seis anos atrás, durante a Nakba, ou “catástrofe” palestina, Mustafa Abu Awwad e sua família foram expulsos de sua casa por gangues sionistas.
Os palestinos utilizam a palavra Nakba em alusão aos eventos de 1948, quando milícias coloniais sionistas expulsaram quase um milhão de pessoas de suas cidades e aldeias sob bombardeios e massacres às terras históricas da Palestina, forçando-as a se alocar em Gaza, Cisjordânia ou na diáspora, mediante limpeza étnica planejada para dar lugar à criação do Estado de Israel.
Aos 88 anos, Mustafa vive hoje no campo de refugiados de Nur Shams, nos arredores da cidade de Tulkarem, no norte da Cisjordânia ocupada.
Para Mustafa, os palestinos estão enfrentando uma nova Nakba — ainda pior do que 1948.
Horrores da Nakba
Mustafa relembra a vida de sua família no vilarejo de Sabbarin, perto da cidade de Haifa, no que hoje é considerado o norte de Israel. Suas memórias são de dias maravilhosos.
Sua família foi expulsa de sua aldeia em 12 de maio de 1948, uma data particularmente terrível, de acordo com o refugiado. “Levamos pouca bagagem porque pensávamos que voltaríamos em alguns dias, talvez algumas semanas — mas assim se passou uma vida”, relatou Mustafa. “Após um mês, decidimos voltar à aldeia, mas a vimos sitiada por gangues armadas que assassinaram 18 rapazes. Tivemos que fugir de novo”.
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Após serem expulsos à força de suas terras ancestrais, Mustafa e sua família passaram a residir em um campo estabelecido por uma entidade beneficente conhecida como Federação Mundial Luterana, próximo a Jenin, na Cisjordânia ocupada, onde permaneceram até 1951.
Então, tiveram de fugir novamente a Nur Shams, onde vive até hoje.
“Jamais esperamos nos tornar refugiados”, lamentou Mustafa. “Minha família tinha um casarão, terras, plantações de trigo e oliveiras e quatro camelos que usávamos para o transporte”. Havia ainda quatro fontes de água em Sabbarin. “Nossa aldeia costumava se reunir para festividades e outras cerimônias, costumávamos resolver nossos problemas através do diálogo … Era uma vida simples e feliz”.
Uma nova Nakba
“A vida no campo é uma miséria. Israel tornou nossas vidas um pesadelo, com invasões diárias a nossas casas”, contrapôs Mustafa. “O que está acontecendo hoje é ainda pior do que fizeram na Nakba, em 1948”.
Desde outubro de 2023, quando teve início o genocídio em Gaza, sua residência no campo, em terras da Cisjordânia, foi vandalizada várias vezes por forças da ocupação israelense. Estima-se 500 mortos e cinco mil feridos na Cisjordânia desde então.
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“Setenta e seis anos se passaram, mas ainda falamos, ‘a liberdade está perto’, teremos o direito de retorno”, destacou Mustafa. “O refugiado palestino ensina a seus filhos que eles tinham uma terra ancestral, uma terra sua, que era de seus avôs, é que eles têm o direito de voltar a ela”.
Na década de 1970, Mustafa e seus filhos visitaram a aldeia e encontraram o local de sua antiga casa tomado por figueiras.
“Meu sonho é voltar para a casa, é morrer na minha terra, e ser sepultado nas terras de minha aldeia”, concluiu Mustafa.
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