António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, ressaltou nesta sexta-feira (16) o alerta para a grave crise humanitária na Faixa de Gaza, sob campanha militar de Israel, ao pedir pelo que descreveu como “pausa da pólio”, em caráter de urgência, no intuito de permitir uma campanha de vacinação de larga escala.
Ao caracterizar a situação em Gaza como “queda livre humanitária”, Guterres destacou a jornalistas: “Quando parece que a situação não pode piorar para o povo palestino de Gaza, seu sofrimento aumenta enquanto o mundo assiste”.
Guterres enfatizou a recente detecção de poliovírus em amostras de esgoto em Deir al-Balah e Khan Younis, ao advertir que “centenas de milhares de crianças estão em risco” e que “a poliomielite não se importa com fronteiras — tampouco espera”.
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Guterres pediu ainda “um esforço massivo, coordenado e urgente” para evitar o surto da doença, ao anunciar planos da Organização das Nações Unida (ONU) para conduzir uma campanha voltada a imunizar mais de 640 mil crianças de Gaza com menos de dez anos.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) liberou recentemente 1.6 milhões de doses no intuito de conter a crise. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), conforme Guterres, está coordenando a logística de entrega e a cadeia de abastecimento.
A Agência das Nações Unidas para a Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), alvejada por Israel, por sua vez, busca deixar de prontidão seus trabalhadores de saúde em campo para administrar as vacinas.
A campanha de vacinação das Nações Unidas deve envolver 708 equipes em centros de saúde e 316 equipes móveis para alcançar comunidades carentes.
Guterres, no entanto, admitiu desafios: “Os sistemas de saúde, água e saneamento de Gaza foram dizimados. A maior parte dos hospitais e clínicas de cuidados primários não está operante. As pessoas são constantemente forçadas a correr por suas vidas”.
Guterres pediu “facilitação nos transportes das vacinas e na rede fria de fornecimento”, assim como permissão de entrada para especialistas em pólio, combustível às equipes, serviços de comunicação adequados e recursos financeiros ao trabalho de saúde.
O diplomata português também reiterou: “Uma campanha bem-sucedida de vacinação contra a poliomielite requer segurança”. Seu alerta parece aludir a ataques israelenses contra clínicas, hospitais e comboios assistenciais nos últimos dez meses.
Guterres solicitou de “todas as partes” “medidas concretas imediatas para assegurar as pausas humanitária para essa campanha”.
“A maior vacina para a pólio é a paz e um cessar-fogo imediato”, insistiu Guterres. “No entanto, em todo caso, uma pausa da pólio é imprescindível. É impossível realizar uma campanha de vacinação contra a poliomielite com a guerra por todos os lados. A pólio vai além da política”.
Guterres concluiu ao sugerir um slogan “Não lutem com gente, lutem com a pólio”, de modo a impedir uma eventual epidemia regional.
Em julho, a OMS manifestou “preocupação extrema” sobre um surto epidêmico depois de encontrar componentes de poliovírus tipo 2 (cVDPV) em amostras de esgoto de Deir al-Balah e Khan Younis, em 23 de junho.
A presença do vírus coincide com diversas epidemias, para além da fome, que tomam o enclave sob agressão israelense. Segundo a Iniciativa Global de Erradicação da Pólio, a crise impõe também desafios aos esforços de monitoramento e imunização.
A cobertura de vacinação contra poliomielite nos territórios palestinos é notavelmente alta, com 99% em 2022. A pólio foi erradicada de Gaza há mais de 25 anos; todavia, no fim de 2023, a cobertura palestina caiu a 89%, no contexto da escalada israelense.
Além da pólio, a ONU reportou surto de hepatite A, difteria e gastroenterite devido às condições sanitárias em Gaza, sobretudo o esgoto a céu aberto próximo aos campos de refugiados superlotados, em meio aos sucessivos bombardeios de Israel.
Atualmente, apenas 16 dos 36 hospitais de Gaza estão parcialmente operantes, assim como 45 das 105 instalações de saúde primária.
Os ataques indiscriminados de Israel a Gaza, desde outubro, deixaram ao menos 40 mil mortos e 90 mil feridos até então, além de dois milhões de desabrigados.
Entre as fatalidades, 15 mil são crianças.
Hospitais, escolas e abrigos das Nações Unidas não foram poupados.
Israel ignora ainda medidas cautelares do Tribunal Internacional de Justiça (TIJ), onde é réu por genocídio sob denúncia sul-africana, além de resoluções por um cessar-fogo do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
As ações israelenses constituem esforços de limpeza étnica, punição coletiva e crime de genocídio.