Ao menos cem mil pessoas cruzaram a fronteira do Líbano à Síria, em fuga dos ataques de Israel ao país levantino, reportou Filippo Grandi, chefe do Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur), em postagem na rede social X (Twitter).
“O número de pessoas que atravessaram à Síria, a partir do Líbano, para fugir dos ataques aéreos de Israel — cidadãos sírios e libaneses — chegou a cem mil”, atualizou o oficial da ONU nesta segunda-feira (30). “A saída, no entanto, continua”.
Segundo Grandi, sua agência opera em quatro travessias de fronteira junto às autoridades locais e ao Crescente Vermelho da Síria, para auxiliar os novos refugiados.
Estima-se ao menos 1.5 milhão de refugiados sírios radicados no Líbano, após mais de 13 anos de guerra civil em seu país natal, deflagrada pela repressão do governo de Bashar al-Assad a protestos populares por democracia.
O fluxo, porém, começou a se inverter nos últimos dias após Israel intensificar suas ações em solo libanês, sob pretexto de combater o influente grupo Hezbollah, ligado a Teerã. Na última semana, ao menos 700 libaneses foram mortos.
A escalada coincide com a véspera do primeiro aniversário do genocídio em Gaza, com 41 mil mortos, 95 mil feridos e dois milhões de desabrigados — contexto no qual a ocupação israelense manteve disparos quase diários contra o Hezbollah através da fronteira.
No entanto, na última quinta-feira (26), o ministro da Defesa de Israel, Yoav Gallant — sob pedido de prisão pela promotoria do Tribunal Penal Internacional (TPI), com sede em Haia — confirmou uma “nova fase” de suas operações armadas, incluindo promessas de uma invasão por terra.
Os avanços ao Líbano tiveram início com uma onda de atentados terroristas atribuídos ao Mossad israelense, na semana anterior, com a detonação remota e coordenada de pagers e walkie-talkies nas ruas libanesas.
Na última sexta-feira (27), Israel realizou um bombardeio à periferia sul de Beirute, no qual assassinou o secretário-geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah.
Crise iminente
Os ataques rapidamente criaram uma nova crise de refugiados. Na sexta-feira, o número de pessoas que haviam atravessado a fronteira libanesa em direção à Síria já superava 30 mil deslocados à força.
O primeiro-ministro libanês, Najib Mikati, afirmou previamente que os ataques aéreos de Tel Aviv podem ter expulsado até um milhão de pessoas de suas casas, no que já aponta à pior crise de deslocamento na história do país.
A Organização Internacional para Migração (OIM) mapeou 200 mil deslocados.
Nesta segunda-feira, centenas de libaneses chegaram também a Istambul, na Turquia.
Voos da companhia libanesa Middle East Airlines de Beirute a Istambul tiveram passagens esgotadas logo na segunda, em meio a cancelamentos das companhias Turkish Airlines e Pegasus Airlines para viagens previstas aos próximos dias.
“A situação no Líbano é péssima”, reiterou Aref Arhad (33), residente de Beirute, que voou em meio ao novo êxodo. “A guerra está se intensificando drasticamente e há bombardeios em toda Beirute. Ouvimos aviões de guerra a noite inteira”.
Lina Diab, jornalista libanesa, antecipou os bombardeios de Israel ao bairro onde morava: “Não queremos viver com medo, então viemos a Istambul, ao menos por enquanto, para ver o que acontece. Quem sabe, com sorte, em breve voltaremos”.
Famílias brasileiro-libanesas buscam contato com o governo de Luiz Inácio Lula da Silva para repatriação. O Ministério de Relações Exteriores (Itamaraty) anunciou estudar ações neste sentido, contudo, sem o anúncio de medidas concretas até então.
Estima-se atualmente 20 mil brasileiros radicados no Líbano.
A questão é particularmente crucial ao Brasil por sua ampla comunidade libanesa — com até dez milhões de cidadãos e descendentes —, que excede a população no próprio país (5.5 milhões) e mantém laços familiares em suas terras ancestrais.