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Soldados israelenses em Gaza ostentam má conduta

Em favor do genocídio de Israel, EUA e Reino Unido obliteram a lei internacional

Cartaz de protesto com retrato do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e a alcunha “Genocide Joe”, na cerca de segurança da Casa Branca, em Washington DC, em 8 de junho de 2024 [Probal Rashid/LightRocket via Getty Images]

Por mais de um ano, aqueles que pedem o fim do massacre israelense contra a população civil de Gaza têm sido implacavelmente difamados: ora como apologistas do Hamas, ora como antissemitas; e mesmo como apoiadores de um genocídio não-existente contra Israel ou contra a comunidade judaica como um todo.

Tamanha difamação é encabeçada por políticos e ideólogos da mídia ocidental, que insistem que Israel conduz uma guerra legítima em “autodefesa”, com objetivos limitados: erradicar o Hamas e libertar algumas dezenas de israelenses que, após 14 meses de campanha, permanecem em Gaza como prisioneiros de guerra.

A conjuntura e as consequências foram varridas do mapa. Que Israel destruiu a infraestrutura necessária para sustentar a vida em Gaza; que bombardeou famílias onde quer que se abrigassem; que chacinou dezenas de milhares de civis — quem sabe, centenas de milhares; e que impôs uma fome deliberada para matar aos poucos toda a população, mediante a retenção de qualquer assistência humanitária.

Para além de tudo isso, Israel falhou em causar impactos consideráveis à capacidade de combate do Hamas e efetivamente pôs em risco ou mesmo matou os reféns via bombardeios indiscriminados.

Enfim, após 14 meses, o Tribunal Penal Internacional (TPI) desferiu um duro golpe às mentiras de Israel — assim como à cumplicidade das elites ocidentais. Em novembro, os juízes da corte deferiram o mandado de prisão contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu e seu ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant. Após seis meses de procrastinação — sob intimidação sem precedentes —, Haia concordou em levá-los ao banco dos réus por crimes de guerra e lesa-humanidade, incluindo fome como arma de guerra e extermínio de civis.

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Caso Netanyahu ou Gallant pisem em território de qualquer um dos 124 Estados-membros da corte — entre os quais, Reino Unido e toda a Europa —, seus anfitriões serão obrigados, sob a lei internacional, a prendê-los e transferi-los a Haia.

As acusações contra Netanyahu e Gallant devem dar ainda mais força ao processo em curso da corte-irmã do TPI, o Tribunal Internacional de Justiça, que investiga a “plausibilidade” de que as ações de Israel configurem genocídio.

O que está claro é que Israel está contra as cordas, assim como aqueles que auxiliam e encobrem seus crimes. Isso inclui o establishment político e midiático ocidental.

Rota de colisão

Este é um momento histórico — e, portanto, perigoso — para a corte e para a ordem legal internacional.

Os juízes enfim encontraram coragem para indiciar um aliado de Washington — de fato, seu Estado-cliente mais bem favorecido —, em vez de manter seu viés contra as violações e os crimes de ditadores africanos ou inimigos do Ocidente. Trata-se de um sinal claro de quão graves e irrefutáveis são os crimes de Israel e o quanto a credibilidade da corte está em jogo, caso continuasse a ignorar tais crimes.

O tribunal se viu entre a cruz e a espada.

Recusar-se a indiciar Netanyahu e Gallant daria a bênção tácita ao desmantelamento, por parte de Israel, pouco a pouco, das leis de guerra. Confirmaria críticas daqueles que dizem que as cortes em Haia não passa de mais uma arma — neste caso, legal — utilizada por Estados Unidos e Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) contra suas desavenças. Além disso, avalizaria que outros Estados citassem Israel como isenção ou álibi para cometer seus crimes de lesa-humanidade.

A corte estaria fadada à própria irrelevância.

Por outro lado, agir contra Israel — por inferência contra Washington e seus clientes europeus — pôs o tribunal em rota direta de colisão com o Ocidente, ao indicar uma crise na ordem legal internacional encabeçada pela corte — um sistema que emergiu imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, para evitar a reincidência dos crimes do Holocausto nazista e do bombardeio atômico dos Estados Unidos contra o Japão.

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Mas este é precisamente o objetivo de Netanyahu, como reportou o jornal israelense Haaretz: “Netanyahu que transformar o mandado de prisão contra ele em uma espécie de petição global para revogar a lei internacional e suas instituições”.

O mais provável, ainda assim, é que Washington derrube toda as estruturas vigentes em vez de acatar um precedente que sacrifique seu Estado-cliente mais militarizado, estrategicamente localizado no Oriente Médio rico em petróleo.

Tampouco espere muito da Europa, mesmo das capitais onde governam os centristas — em vez dos nacionalistas e ultranacionalistas. A hipocrisia da União Europeia, comprometida retoricamente com o Estado de direito e os princípios humanitários, mas que, na prática, se mantém dependente militar, econômica e ideologicamente a Washington, logo serão expostos.

Princípios humanitários só lhes servem quando são cômodos a sua agenda geopolítica ou àquele de Washington — mais recentemente, ao usar a Ucrânia como um campo de batalha para combater indiretamente a Rússia.

Difamados como antissemitas

Dadas as evidências do que Israel tem feito nos últimos 13 meses — matando centenas de milhares de civis, conforme estimativas conservadoras, impondo um embargo assistencial —, além das declarações de lideranças israelenses de seu intento de tornar Gaza inabitável, é difícil conceber como a corte não poderia considerar Gallant ou Netanyahu claramente culpados, caso enfim cheguem a julgamento.

Ao menos, é inconcebível caso as ponderações legais — em vez das ponderações políticas — sejam a prioridade na forma de pensar dos juízes. Afinal, mesmo um ex-chefe do exército israelense, Moshe Yaalon, admitiu que está claro que Israel não está se defendendo em Gaza, mas sim “conduzindo uma limpeza étnica” no enclave palestino — em suas próprias palavras.

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É por isso que a campanha para poluir o processo com questões escusas começou imediatamente. Netanyahu não tardou em difamar a corte como “antissemita”, o que vem fazendo com qualquer um que ouse responsabilizá-lo, ou o exército da ocupação israelense, por suas flagrantes violações do direito internacional e das normas de guerra.

Netanyahu alegou que Israel não estaria matando a população de fome, apesar de dados da Organização das Nações Unidas (ONU) confirmarem que, na prática, nenhum alimento foi entregue à maior parte de Gaza em ao menos 40 dias. Segundo a ONU, no entanto, as pessoas enfrentam “condições minguantes para sobreviver”.

Ainda assim, de acordo com Netanyahu, as evidências diante de nossos olhos não são nada mais que uma conspiração contra seu nome — e, portanto, contra Israel.

Mais uma vez, Netanyahu, ecoado por seus apologistas, impuseram uma escolha binária e facciosa que apenas alimenta o verdadeiro antissemitismo: apoiem o genocídio de Israel em Gaza ou sejam expostos como racistas contra o povo judeu.

Palestinos, ativistas solidários e organizações de direitos humanos, contudo, estão acostumados. Podemos dizer o mesmo, entretanto, dos juízes da mais alta corte internacional, agora também caluniados como “antissemitas”? Poderia haver, de fato, um caminho mais curto para devastar o termo e dar espaço livre ao verdadeiro antissemitismo?

Os piores criminosos

Cada qual a seu modo, os líderes ocidentais sutilmente reafirmaram a trivialização do antissemitismo e, por inferência, dos crimes de lesa-humanidade e genocídio perpetrados por Netanyahu.

Em vez de defender com firmeza a corte e o Estado de direito, tentaram desesperadamente distorcer a narrativa: Israel seria a parte vulnerável, não as dezenas de milhares de crianças palestinas mortas e mutiladas por suas bombas; não os dois milhões de civis palestinos que morrem de fome sob o cerco militar.

Mas, como sempre, Estados Unidos e Reino Unido são os piores criminosos.

O presidente Joe Biden impugnou os motivos da corte, ao descrever a decisão de aplicar a lei internacional contra o maior Estado-cliente de Washington como “ultrajante”. Um porta-voz da Casa Branca alegou “erros processuais”, mas sem conseguir, porém, especificá-los. Estados Unidos e Israel reforçaram sua recusa em ratificar o Estatuto de Roma, documento fundador de Haia, por uma razão mais clara do que nunca: consideram-se ambos acima da lei internacional.

Em outras palavras, a lei internacional seria meramente um veículo a seus próprios interesses, não um contrapeso a seu comportamento militar. Os indiciamentos de Haia contra Netanyahu e Gallant viraram do avesso a “ordem global baseada em regras”, desde que essas regras sejam ditadas exclusivamente por Washington.

Na semana passada, o jornal americano The Washington Post disse o que ninguém parecia ter coragem de dizer: que o tribunal não poderia sequer investigar “líderes eleitos de um país democrático [sic]” por seus crimes de lesa-humanidade. Mesmo que aceitemos essa premissa falsa, no entanto — são apenas ditadores que cometem crimes de guerra? —, Israel não é democrático coisa nenhuma, mas sim um Estado colonial constituído via apartheid e assentamento ilegal, como alertam organizações humanitárias, incluindo israelenses, há anos e anos.

Este genocídio é apenas a culminação de décadas de um processo de soma-zero no qual Israel buscou erradicar reivindicações nacionais contrárias a seu projeto, das comunidades palestinas nativas que clamam por sua terra. De fato, está no DNA dos Estados coloniais segregar e exterminar os nativos — como os Estados Unidos deveriam bem saber, considerando sua própria história.

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Do lado da direita americana, há até mesmo apelos para que se invoque o “Ato de Invasão de Haia”, de 2002, caso Netanyahu ou Gallant cheguem ao banco dos réus. Esta legislação permitiria a Washington usar seu poderio militar contra a corte, caso oficiais do Pentágono fossem investigados por crimes de guerra. De maneira mais imediata, a cumplicidade bipartidária parece crescer em Washington, no intuito de reaver sanções contra oficiais de Haia — ameaça projetada para subverter o processo, mas que, em si, representa provável crime sob a lei internacional.

Em 2020, o então presidente Donald Trump impôs sanções draconianas a Haia após a corte confirmar uma investigação sobre crimes de guerra americanos e israelenses, tanto no Afeganistão quanto na Palestina ocupada, respectivamente. Biden derrubou a retaliação, poucos meses após assumir posse, mas apenas caso a corte “despriorizasse” seu inquérito sobre o Afeganistão.

Trump retornará ao Salão Oval em questão de semanas. A corte internacional deve enfrentar sua fúria, mais uma vez.

Duplo engano

Estados europeus já se prontificaram a tomar do “lado certo” de Washington e ignorar suas obrigações sob o Estatuto de Roma.

A França sugeriu, a princípio, acatar ao mandado contra Netanyahu, mas capitulou na semana seguinte, ao alegar que o premiê teria “imunidade”. Paris ecoou a Casa Branca ao justificar sua decisão sobre o argumento absolutamente refutado de que Israel não integra a corte em Haia. Como muito se disse, a corte confirmou previamente ter jurisdição sobre os territórios palestinos — local dos crimes israelenses.

O Reino Unido não chegou a desafiar abertamente Haia. Em vez disso, ofertou ao público um apoio vago, de boca miúda. O primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, e seu secretário de Relações Exteriores, David Lammy, ambos advogados, mantiveram um silêncio meticuloso à medida que Netanyahu e Biden buscavam macular a reputação da corte e os próprios alicerces da lei internacional.

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Yvette Cooper, secretária do Interior, cujo cargo a incumbe de aprovar a prisão caso Gallant ou Netanyahu pisem em seu território, deu de ombros, ao subitamente fingir não compreender os aspectos mais elementares da lei britânica — ou de sua função. À televisão, insistiu a ministra, em uma resposta claramente ensaiada: “Isso não me cabe”.

O porta-voz do governo em Londres comentou apenas que o Reino Unido “cumpriria suas obrigações legais”, sem deixar claro como se interpretam essas obrigações.

Vale notar que Herzi Halevi, chefe do exército israelense e topo da lista de prováveis indiciamentos futuros pelo tribunal de Haia, visitou o Reino Unido nas últimas semanas, para um encontro com diversos oficiais de outros países. É quase certo que a administração trabalhista de Starmer lhe tenha emitido “imunidade de missão especial”, dado o risco de que um mandado internacional surpreendesse sua visita.

Há aqui um padrão gritante, difícil de ignorar.

Pouco antes do TPI anunciar os mandados contra Netanyahu e Gallant, Lammy condenou a Rússia nas Nações Unidas em termos claros e inequívocos por vetar uma moção do Conselho de Segurança, proposta pelo Reino Unido, para proteger civis no Sudão. Lammy alegou temer que a guerra sudanesa tenha submetido cidadãos comuns — em suas próprias palavras — a crimes de guerra, incluindo “assassinato, estupro e fome”.

A questão é por que então Lammy não sente o mesmo diante do “assassinato, estupro e fome” que incorre aos civis na Faixa de Gaza? Todos esses estão abundantemente documentados, em detalhes gráficos, desde o ano passado, e são centrais aos processos do TPI e do TIJ contra a liderança e o Estado israelense, respectivamente.

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Por que, da mesma forma, Lammy não ostentou palavras de desagrado — como fez com a Rússia — quando a administração americana de Joe Biden vetou uma resolução do Conselho de Segurança por um cessar-fogo em Gaza, a fim de dar cabo dos assassinatos de civis palestinos e assegurar a soltura dos reféns israelenses?

Alegação de cair o queixo

Não apenas a hipocrisia do governo em Londres que está exposta para que todos vejam. Lammy e Starmer se sentiram obrigados a fingir ignorância sobre os aspectos mais fundamentais da lei internacional, ao negar até mesmo que Israel esteja executando um genocídio na Faixa de Gaza.

Em um momento de cair o queixo, em novembro, Lammy negou que o exército israelense tenha matado palestinos suficientes no enclave, para que sua campanha seja classificada como genocídio.

Trata-se de uma falácia duplamente hedionda.

Lammy sabe que a morte de Gaza está necessariamente subnotificada. Os sistemas de saúde e governança do território, em caos absoluto após mais de um ano de bombardeios, não estão em posição de registrar a maioria das mortes, mesmo se assumirmos que é ainda possível retirar os corpos dos escombros para identificá-los.

Vale reiterar também que nenhum advogado ou juiz sério acha que genocídio se determina pela contagem de mortos ou por uma fórmula matemática. A Convenção de Genocídio especificamente lista formas em que este crime se conduz — como transferência compulsória de crianças de um grupo a outro —, sem incorrer, porém, em perdas de vida.

Como Francesca Albanese, relatora especial das Nações Unidas, tem observado reiteradamente, o objetivo da Convenção de Genocídio é reconhecer este crime em seu estágio mais preliminar possível, para prevenir o extermínio em massa. Neste caso, impedir que Israel dissemine seu genocídio de Gaza à Cisjordânia e Jerusalém Oriental.

“Genocídio é um processo, não um ato”, notou Albanese. “E nenhum palestino está seguro sob o domínio de Israel”.

A convenção não existe, como sugere Lammy, apenas como diretriz em avaliar retroativamente se um genocídio ocorreu ou não, após o fracasso em antepará-lo. Trata-se de um erro de compreensão aterrador dos princípios da lei, por um oficial como Lammy, que Albanese caracterizou adequadamente como “negacionista” — termo que serve também para Starmer.

O premiê, em novembro, proclamou à Câmara dos Comuns que, de sua própria experiência como advogado de direitos humanos, poderia assegurar que a campanha israelense em Gaza não constitue genocídio. Contudo, se a vida pregressa profissional de Starmer prova alguma coisa, é o quão econômico ele é no que diz respeito à verdade sobre a devastação em Gaza.

Sem coragem, sem convicção

Por meses e meses, a mídia mainstream tem sido cuidadosa em evitar aludir aos vídeos que viralizaram nas redes sociais de Starmer definindo genocídio antes que Israel deflagrasse seus massacres em Gaza. Em um desses vídeos, datado de 2014, Starmer discursa ao TIJ, caracterizando minuciosamente as políticas genocidas da Sérvia no cerco à cidade de Vukovar, na Croácia, em 1991, após o colapso da antiga Iugoslávia.

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“Forças sérvias conduziram uma campanha contínua de bombardeios, expulsão sistêmica, negação de alimentos, água, eletricidade, saneamento e cuidados médicos — bombardeios, incêndios, assassinatos e tortura —; tudo isso reduziu a cidade a escombros e devastou a população croata”, disse Starmer na ocasião.

Então esclareceu a razão pela qual tais atos devem ser denominados como “genocídio”, em vez de “conflito armado”. Para o Starmer de então, muito antes da campanha israelense, as ações sérvias seriam um “ataque radicalmente desproporcional, com o intuito deliberado de destruir a cidade e sua população civil”.

Como Starmer sabe muito bem, os crimes de Israel em Gaza são ainda piores — e maiores — do que qualquer coisa que transcorreu a Vukovar. Diferente da cidade croata, no caso israelense, seus líderes não se acanharam em declarar aos quatro ventos intenção genocida sobre o povo palestino.

Portanto, para usar a própria definição de Starmer, como que a chacina israelense em Gaza simplesmente não conta como genocídio?

Em julho de 2020, logo após ascender à liderança do Partido Trabalhista britânico, Starmer divulgou um vídeo para marcar o Dia em Memória de Srebrenica — o aniversário do genocídio de 1995 contra cerca de oito mil homens e meninos da comunidade muçulmana na Bósnia, em 1995, conduzido por forças sérvias que enterraram as vítimas em covas coletivas. Starmer, vale observar, chamou o incidente por seu nome — “genocídio” — e reafirmou “jamais esquecer”.

Se Starmer tinha tanta certeza de que o massacre de Srebrenica constituía genocídio — um pequeno front em uma guerra muito maior —, como é que os assassinatos perpetrados por Israel em Gaza, em uma escala incomparavelmente maior, não seriam classificados como genocídio?

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Starmer não parou por aí e alegou que seria uma tarefa do Ocidente “usar a indignação e a agonia de crimes como Srebrenica para encontrar coragem e convicção para dizer: ‘Nunca mais’. Três anos depois, Starmer perdeu sua coragem e convicção, para contrapor seja Israel ou os Estados Unidos, e declarar em alto e bom som “Nunca mais é nunca mais todos”, à medida que se desdobra o genocídio em Gaza.

Cumplicidade exposta

Os comentários de Starmer e Lammy deveriam ser vistos pelo que são: uma tentativa de subverter as leis da guerra, sob os arbítrios de Israel e dos Estados Unidos.

Em seu persistente negacionismo, ambos buscaram sabotar, na prática, a legitimidade do TIJ e de seu painel de juízes —estimados juristas internacionais. Há dez meses, a instituição admitiu como “plausível” a denúncia de que Israel estaria conduzindo um genocídio em Gaza. A situação, hoje, no entanto, é muito, muito pior.

Starmer e Lammy têm tratado Haia com desdém — primeiro o Tribunal Internacional de Justiça; agora, por meio de suas evasivas e seus dois pesos e duas medidas, ao enfraquecer também o Tribunal Penal Internacional.

O predecessor de Starmer na liderança trabalhista, Jeremy Corbyn, chegou a preconizar que o governo britânico ousaria negar que o massacre em Gaza seria um genocídio, considerando que tal posicionamento de acordo com a verdade “seria reconhecer sua própria cumplicidade em um dos maiores crimes de nosso tempo”. Em parte, Corbyn está certo. Sem dúvida, a demora do TPI em deferir seus mandados de prisão contra Netanyahu e Gallant reflete o estresse em que o processo poderia desembocar.

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Será difícil restringir as acusações a ambos quando lideranças ocidentais — incluindo Biden, Starmer e Lammy — demonstram, dia após dia, que merecem se sentar no mesmo banco dos réus.

O Reino Unido conspira intimamente com o genocídio israelense desde seus primórdios, por exemplo, ao vender armas e componentes vitais às operações de jatos F-35, responsáveis por bombardear Gaza e matar dezenas de milhares de civis. Londres arma Israel a partir de sua base aérea no Chipre, com o maior número de entregas armamentistas à ocupação ocorrendo via Força Aérea Real (RAF).

Da mesma base, aeronaves de vigilância do Reino Unido partem para sobrevoar discretamente Gaza, diversas vezes ao dia, para repassar informações a Israel — então utilizadas para alvejar e destruir infraestrutura, tornando o enclave inabitável.

Como se não bastasse, Starmer e seu governo buscam justificar os crimes de guerra israelenses como “autodefesa”, na tentativa de esvaziar de antemão o julgamento de Haia sobre a culpa ou absolvição de Israel pelo crime de genocídio.

Tudo isso vai além do negacionismo, ao reino da conspiração e participação ativa.

O triunfo dos mentirosos

Mas não se trata apenas de autopreservação. O número de especialistas que denunciam o genocídio em Gaza cresce a cada dia. Mesmo pesquisadores israelenses sobre o Holocausto somaram suas vozes. Um deles, Omer Bartov, crê que não apenas é genocídio, o que acontece em Gaza, como este alcançou seu “estágio final”.

Starmer poderia voltar atrás sem dificuldades, ao aderir à decisão do TPI como oportunidade para declarar que Israel cruzou os limites e que o Reino Unido deve deixar de colaborar com a erradicação de Gaza. Starmer escolheu o contrário — decidiu amparar Israel em levar seu genocídio às últimas consequências.

Ao vaguear entre o apoio ou a oposição britânica sobre a lei internacional, em um momento em que Israel e Estados Unidos estão determinados em destruí-la tijolo por tijolo, Starmer incorre em um pecado muito, muito maior — conspira com o desmantelamento do próprio estado de direito e das instituições que o sustentam, como as cortes em Haia.

Somente duas lições possíveis podem ser tomadas: ou o Reino Unido jamais apoiou de verdade a lei internacional — e sua assinatura do Estatuto de Roma só ocorreu por acreditar que a corte existia para punir terceiros; jamais as autoproclamadas “democracias ocidentais” —; ou o país, como o restante da Europa, não é verdadeiramente independente e soberano, mas sim um posto avançado, um protetorado, uma província do Império estabelecido em Washington, que dita e desdita sua política externa. Neste caso, não é possível sequer contemplar oposição, pois esta não seria minimamente tolerada.

Ou, quem sabe, são ambos os casos.

Seja como for, a verdade é que a ideia de democracia liberal britânica está desmoronando diante de nossos olhos. Quando supostos guardiões da ordem liberal, do estado de direito e dos princípios humanitários são desmascarados como nada mais que charlatões — como é o caso de Biden e Starmer — as forças do mal correm para preencher as lacunas deixadas por essas figuras.

Quando tudo é mentira, triunfam os maiores mentirosos. Este é o futuro que nos aguarda.

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As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a política editorial do Middle East Monitor.

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