O general Joseph Aoun, comandante do exército do Líbano, eleito à presidência do país levantino nesta quinta-feira (9), manteve suas tropas no aguardo diante do conflito recente entre Israel e o influente movimento Hezbollah, ao ordenar prioridade pela paz cívica mesmo enquanto seus soldados eram mortos.
Aoun, militar de carreira de 60 anos de idade, tornou-se o quinto chefe do exército a chegar à presidência libanesa, ao encerrar uma vacância de dois anos no cargo, após o fim do mandato de Michel Aoun em outubro de 2022 — com quem não tem relações de parentesco, apesar do sobrenome.
Desde que assumiu o exército, em 2017, Aoun navegou pela maior crise de instabilidade nacional desde a guerra civil entre 1975 e 1990, em meio ao colapso da economia, devastando o valor da moeda e empobrecendo a população, incluindo com cortes consideráveis no salário de seus soldados.
Diante de sua escolha por distanciar-se da guerra entre Israel e Hezbollah — e, por inferência, da crise em Gaza —, o movimento xiita expressou ressalvas à candidatura de Aoun. Ataques israelenses mataram ao menos 40 soldados libaneses, no período de um ano, apesar do comandante insistir em não confrontar diretamente Israel.
O Hezbollah, com sua liderança abalada pelo conflito, não conseguiu, no entanto, derrotar a candidatura.
Aoun se mantém reservado, ao limitar aparições à imprensa; tampouco comentou, durante seu mandato, sobre os arsenais mantidos pelo Hezbollah, considerados muito maiores e mais poderosos do que o próprio exército regular.
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Em rara entrevista ao jornal pró-Hezbollah Al-Akhbar, concedida em 2017, Aoun prometeu “conter a interferência política” nas Forças Armadas.
Conforme relatos, porém, o general foi figura chave em firmar um cessar-fogo de 60 dias entre Israel e Hezbollah, mediado por Estados Unidos e França, em vigor desde novembro. O acordo atribuiu funções às tropas de Aoun, enviadas ao sul do Líbano para garantir o recuo das partes às áreas designadas.
Em encontros com deputados libaneses às vésperas das eleições desta quinta, representantes dos Estados Unidos e do Golfo deram anuência à presidência de Aoun, contudo, sem apoiá-lo às claras, para evitar um revés em termos políticos.
Aoun não falou de sua candidatura ou fez campanha pública entre as diversas e divergentes facções libanesas, como tradicionalmente se faz às vésperas da eleição. No entanto, angariou 99 votos de uma câmara de 128 assentos.
Postura discreta
Aoun nasceu em Sin el-Fil, perto de Beirute, e se alistou no exército em 1983, durante a guerra civil libanesa. Sua primeira missão oficial se deu como chefe de pelotão de infantaria dois anos depois, somada a dois cursos dados nos Estados Unidos.
Pouco após ascender ao topo da carreira, o exército investiu em uma missão para remover células terroristas do Estado Islâmico (Daesh) da região de fronteira com a Síria. Aoun foi exaltado então pela embaixada americana, que proclamou um “excelente trabalho”.
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Ao se tornar chefe de Estado, posto reservado a um cristão maronita sob o sistema sectário do Líbano, Aoun segue os passos de outros veteranos militares, entre os quais seu antecessor Michel Aoun.
Em 2021, o general deu uma breve e incomum declaração política, ao criticar o governo pelo colapso fiscal e alertar que soldados “passavam fome junto à população” e questionar às autoridades “o que é que pretendem fazer?”
Anos depois, a crise persevera — somada à instabilidade regional deflagrada pelo genocídio israelense na Faixa de Gaza, junto à invasão territorial ao Líbano, de modo que as cobranças de Aoun devem ser agora postas à prova.
Os Estados Unidos, que investiram mais de US$2.5 bilhões nas Forças Armadas libanesas desde 2006, aumentaram o apoio, sob a prerrogativa de ajudar a pagar o salário dos soldados. Não se sabe, no entanto, quais as contrapartidas — exceto a criminalização de Washington do grupo Hezbollah.
Em seu característico tom lacônico, Aoun descreveu o apoio de Estados amistosos, como Catar, como “fundamental durante essa fase”.
Aoun é casado e tem dois filhos.